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Campeões da arrogância

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Os jogadores não são muito diferentes. Todos aprendem arrogância nas categorias de base. E, na minha opinião, aprendem bastante com os dirigentes, mestres nas artes do desprezo e da prepotência, Foto: Thomaz Farkas

Ingo Ostrovsky
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Entre todas as coisas desimportantes da vida, o futebol é a mais importante. Não sei quem é o autor dessa máxima que eu, modestamente, aceito como verdade. O futebol se arroga esta importância até entre as coisas que não tem a menor importância, o que faz desse esporte, pelo menos no Brasil, um poço de arrogância.

Fui ao dicionário para definições de arrogante. O Houaiss crava logo “soberbo e presunçoso”. O futebol tá cheio desses. Posso arriscar sem medo de errar: a soberba aparece dentro e fora dos gramados. Jogadores, técnicos e dirigentes abusam desse pecado capital com a maior cara de pau. Tempos atrás li um artigo de um jornalista inglês que defendia a tese de que o futebol é um esporte difícil de ser praticado, pois controlar a bola com os pés é bem mais complicado do que fazê-lo com as mãos, o que seria mais natural. Pode estar aí uma razão para essa arrogância, só os bem aquinhoados conseguem praticar com sucesso essa difícil atividade. Longe de ser uma desculpa, é um imperativo: me arrogo o direito de ser arrogante porque sei jogar bola…

O Houaiss diz mais: os arrogantes são insolentes e mal educados. Você consegue reconhecer profissionais de futebol nessa categoria? Muitos. Aparece em qualquer entrevista coletiva de técnico – ou professor, como eles, arrogantemente, gostam de ser chamados. Quantos conflitos entre entrevistado e entrevistadores a gente já testemunhou? Dezenas de vezes a estudada insolência dos técnicos se choca com a indigente insolência dos repórteres. Às vezes sai faísca. Nessas ocasiões os profissionais de futebol se comportam como se apenas eles conhecessem a “verdade” enquanto os perguntadores usam uma pretensa arrogância para desafiar certezas desse tipo.

O técnico português que ganhou tudo com o Flamengo em 2019 era muito prepotente. Se deu bem porque foi vitorioso – e merece aplausos pelos títulos que conseguiu. Não era menos arrogante que seus três sucessores, todos demitidos por resultados fracos. Primeiro um catalão de nariz em pé; depois um ex-jogador, ídolo como goleiro de uma grande equipe paulista; e por fim um artilheiro gozador, vencedor em inúmeras equipes e dono de um nível de arrogância e prepotência que deixa seus pares muitos pontos abaixo na tabela, um verdadeiro campeão.

Estou falando só do Flamengo, mas poderia escrever tratados inteiros sobre qualquer outra equipe. E mais, não me leve a mal por falar apenas dos técnicos. Os protagonistas, ou seja, os artistas, os jogadores, não são muito diferentes, todos aprendem arrogância nas categorias de base. E, na minha opinião, aprendem bastante com os dirigentes, mestres nas artes do desprezo e da prepotência.

Esta semana, com o fim do Brasileirão, vimos arrogância e prepotência até nos dirigentes das equipes que foram rebaixadas. Todos pediram desculpas mas garantiram que sabem mais que os outros e que ano que vem… bem aí teremos que esperar.

Um último e importante detalhe: os dirigentes do futebol brasileiro são conhecidos como cartolas. Ninguém é chamado de “boné” ou de “chapéu côco” ou “panamá”. É cartola mesmo, o adereço que cobre a cabeça dos poderosos, dos bem vestidos, dos que nem precisam de educação para ter um efêmero poder. Isso diz muito sobre arrogância, voce concorda?

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