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Enquanto Japão valoriza os velhos (aprenderam mais), aqui há desprezo, por estupidez

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Nelson Motta: “Tenho 77 anos bem vividos e, graças a Deus, estou plenamente positivo e operante, o corpo castigado sente o peso do tempo, mas me sinto no melhor momento profissional da vida, nunca trabalhei e produzi tanto”. Foto: Internet

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“Uns têm preconceito contra negros, mulheres, gays; outros, contra velhos.” A frase é do  jornalista, compositor, escritor, roteirista, produtor musical, teatrólogo e letrista Nelson Motta neste texto, que é mais um desabafo contra o chamado idadismo ou etarismo: nada mais é do que preconceito contra pessoas mais velhas.

Aos 77 anos, ele se sente vítima daqueles que não têm argumentos. Se não gostam de algo que escreveu, logo vêm com uma palavra que usam como xingamento: velho! Esse tipo de preconceito, todo mundo que passou dos 50 sofre na pele, porque a visão de que a passagem do tempo tira o valor das pessoas é muito forte no Brasil.

Leia o que diz Nelson Motta:

Às vezes, passeando pelas redes, vejo comentários de pessoas que não gostaram do que escrevi. Não falam sobre o texto, geralmente nem o leram inteiro, só respondem “velho”, “senil”, “gagá”, como argumento. Isso me ofende tanto quanto o latido de um cachorro, mas acho interessante procurar de onde vem tanta ignorância, inveja e rancor.

Dei uma olhada no perfil dos abusados. Como eles têm pouquíssimos seguidores, talvez estejam frustrados com o excesso de anonimato. Examino as caras, o que fazem e onde vivem. São o que nos tempos de Machado de Assis era chamado de “pobre diabo”.

Tenho 77 anos bem vividos e, graças a Deus, estou plenamente positivo e operante, o corpo castigado sente o peso do tempo, mas me sinto no melhor momento profissional da vida, nunca trabalhei e produzi tanto. Quem xinga de “velho” não imagina que nada lhe garante que sequer chegará à velhice (rsrs), como é tola a arrogância dos pobres diabos. Chegar à minha idade no Brasil é uma glória. A sobrevivência, um prêmio. A experiência, um tesouro. A descendência, um sentido à existência. Estou satisfeitíssimo e muito grato com o que o tempo me deu, e não lamento o que me tirou. C’est la vie.

Vocês sabem, elogios vindos de quem você despreza são recebidos como ofensas. Assim como ofensas dos desprezíveis falam mais deles do que de você. Não perco tempo nessas bobagens, mas me despertam um interesse, digamos, antropológico. Zoológico. E, sem querer, alertam para temas importantes.

Como a hashtag #MinhaIdadeNãoMeDefine, bombando nas redes. Ter 70 anos com corpo de 50, ter 80 com cabeça de 40, ter 75 com o corpo bem cuidado e a cabeça madura, porque, se a cabeça estacionar no passado, de pouco vale estar em forma, e vice-versa. Quem vive de passado é historiador e biógrafo, os novos velhos estão ocupados em viver o presente e pensar no futuro.

Envelhecer é biológico, amadurecer, uma dádiva, o perigo é apodrecer, se sentir inútil, passado, aposentado. É preciso acompanhar o tempo, valorizar cada momento, sem medo de novas experiências, e de novos erros.

Os novos velhos são digitais, mesmo em ritmo mais lento e esquecendo senhas, têm acesso a todas as informações, estão atualizados, se beneficiam da medicina e da ciência para usar sua experiência de forma produtiva. Drauzio Varella, 78, corre 10km todos os dias.

Mas, no Brasil, ao contrário do Japão, não são respeitados. Enquanto lá há séculos eles valorizam os mais velhos (porque aprenderam mais, e por isso devem saber mais), nós aqui os desprezamos, em todas as classes sociais, por ignorância, preconceito e estupidez. Por ignorar que são úteis e experientes e ainda têm vitalidade para contribuir muito para a sociedade, ainda mais com as facilidades do mundo digital.

 

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