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“Com todo o progresso da ciência em progressão geométrica, os octogenários de hoje têm possibilidades e recursos para uma vida muito melhor do que os octogenários da geração de meu pai, que viveu até os 92 anos.”
Quem faz essa afirmação é o jornalista e escritor Nelson Motta, 80, nessa pequena reflexão sobre o envelhecer, que ganhou o título de “A nova velhice sem velharias.”
Concordo inteiramente. Meu próprio pai morreu aos 89 anos. Naquele tempo, não havia os avanços da medicina que temos hoje, não tínhamos todo o conhecimento sobre os benefícios da boa alimentação nem da importância de se praticar exercício físico com regularidade.
“Carregar 80 anos de vivência e experiência do melhor e do pior é um privilégio insuperável, um capital intelectual capaz de produzir mais e melhor do que nunca, enquanto o corpo aguentar” – conclui Nelson Motta.
Leia o texto completo, publicado por O Globo:
O assunto deve interessar não só aos atuais velhos, mas aos futuros velhos de todas as gerações. Como tem cada vez mais gente vivendo mais tempo, a discussão da velhice se tornou uma urgência na corrida contra o tempo.
Com todo o progresso da ciência em progressão geométrica, os octogenários de hoje têm possibilidades e recursos para uma vida muito melhor do que os octogenários da geração de meu pai, que viveu até os 92 anos. Todo mundo sabe o básico, alimentação, exercícios, atividade, mas isso é o corpo, a cabeça, que manda em tudo, não pode ser sedentária nem se alimentar de lixo da internet e de gorduras emocionais saturadas.
E Malhar a cabeça é fundamental, mantê-la musculosa e flexível, capaz de te levar aonde você quiser. Tão fundamental como recursos para uma manutenção digna e integração familiar e afetiva. Sem amor e sem dinheiro, a velhice é a coisa mais triste que existe.
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Mas carregar 80 anos de vivência e experiência do melhor e do pior é um privilégio insuperável, um capital intelectual capaz de produzir mais e melhor do que nunca, enquanto o corpo aguentar. Hoje há muito mais oitentões do que há dez, 20 anos, vivendo em condições muito melhores. E muitos no desprezo e no abandono.
O assunto é etarismo, preconceitos contra os mais velhos, no trabalho, na vida social e afetiva. Vejam os japoneses, muito mais ricos e civilizados e experientes do que nós, que valorizam e desfrutam da experiência dos mais velhos ao máximo, porque viveram mais, então sabem mais do seu trabalho e da vida social e familiar.
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Um amigo me deu de presente nos meus 80 anos o discurso que meu pai, advogado e guru, fez quando comemorou seus 80 anos com um grande jantar reunindo num salão família, amigos, companheiros e admiradores do mundo jurídico.
“Se soubesse que iria receber tantas demonstrações de afeto e de carinho certamente teria ficado um octogenário há bem mais tempo. Mas não gosto de virar octogenário, não é uma palavra mas um palavrão. A propósito, vou contar uma história:
Quando eu tinha 6 anos fui matriculado no Grupo Escolar Marechal Floriano, na Vila Mariana, em São Paulo. Minha professora, dona Leonor, gorducha, baixinha, parecia uma galinha d’Angola e andava armada com uma régua, que ela aplicava, com precisão e competência, nas juntas mais doídas dos nossos dedos. Um dia, começou a ensinar as sílabas: ‘b-a, ba; b-e, be; b- i, bi’; e assim por diante. E me chamou lá na frente para declinar as sílabas em C.
Fui dizendo ‘c-a, ca; c-e, ce; c-i, ci; c-o, co…’ E aí parei. Ela ordenou: “Continue!” Eu não continuei. Ela falou mais alto: “Continue !” Permaneci mudo, com a ultima sílaba entalada nos meus primeiros pudores.
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Essa foi a primeira e tocante manifestação de solidariedades que recebi dos meus colegas. A outra é a que estou recebendo hoje, muito obrigado a todos pelo carinho e pela afeição.”