Daqui a um ano completa-se o cinquentenário do golpe militar de 31 de março de 1964, que derrubou o presidente João Goulart, estabelecendo a mais longa ditadura de nosso período republicano. Por razões de agenda e dever de ofício, a 18ª edição do É Tudo Verdade – Festival Internacional de Documentários antecipa o debate em sua retrospectiva brasileira deste ano.
O ciclo “‘Jango’ e o Caminho para 1964” concentra-se em torno de dois eixos. O primeiro elege “Jango” (1984), de Silvio Tendler, como o filme que melhor ilumina o processo de desestabilização do regime democrático que culminou com o levante militar. Além do convite para revisão de “Jango” em tela grande, o festival realiza duas mesas históricas, no Centro Cultural Banco do Brasil de São Paulo no próximo dia 3 de abril e no CCBB do Rio no dia 4, em que promove o reencontro de Tendler com alguns de seus principais parceiros na realização do filme.
“Jango”, nunca é demais frisar, foi corajosamente produzido ainda nos estertores do regime militar. João Goulart (1919 – 1976), o único presidente brasileiro a morrer no exílio, era assim ainda “persona non grata” para o poder. Toda uma geração – a minha – já havia nascido e sido formada sob um discurso oficial que o estigmatizava como o político fraco e esquerdista que escancarara o país para a eclosão de um regime autoritário sindicalista, apenas inviabilizado pelo movimento militar.
Um milhão de espectadores, número inimaginável hoje para qualquer documentário nacional nas salas, correu aos cinemas para assistir ao primeiro retrato fílmico do presidente deposto. Descobriu um filme emocionante e rigoroso, estruturado a partir de valiosos depoimentos de protagonistas do processo e de sons e imagens de arquivo de tirar o fôlego em seu ineditismo.
Com “Jango”, Silvio Tendler começava a reconciliar o Brasil com Jango. Para compreender como o cineasta se formou para cumprir esse papel pioneiro em nossa produção audiovisual, é essencial revisitar seu documentário político anterior, “Os Anos JK – Uma Trajetória Política” (1980), também incluído no ciclo.
Igualmente corajoso e desbravador, ao reconstituir a vida e a carreira do presidente Juscelino Kubitschek (1902 – 1976), “Os Anos JK” já apresentava uma leitura da experiência democrática brasileira entre 1945 e 1964 em tudo distinta da então propagandeada pelo regime militar. Leia mais em valor.com.br