Leonardo Lichote, O Globo
Gal Costa passeia o dedo pela tela de seu celular, até que pede os óculos. Quer ler um trecho de “Os irmãos Karamázov”. A entrevista é sobre seu novo disco, “Estratosférica” (Sony), que chega às lojas no fim do mês. No álbum, Gal grava compositores jovens, como Arthur Nogueira, Mallu, Céu, Lira, Zeca Veloso, Marcelo e Thiago Camelo, Criolo e Jonas Sá, ao lado de nomes consagrados, como Tom Zé, Caetano Veloso, Antonio Cicero, Marisa Monte e Milton Nascimento, muitas vezes em parcerias inéditas que cruzam as gerações. Ela põe as lentes e lê Dostoiévski: “Somos assim: sonhamos o voo, mas tememos a altura. Para voar é preciso ter coragem para enfrentar o terror do vazio. Porque é só no vazio que o voo acontece”.
Gal saca o texto do escritor russo para tratar do desejo que a move e que atravessa o disco: afirmar-se no presente. Um desejo expresso já na abertura de “Estratosférica”, nos versos de Antonio Cicero para a música de Arthur Nogueira em “Sem medo nem esperança”: “Não sou mais tola/ Não mais me queixo/ Não tenho medo/ Nem esperança/ Nada do que fiz/ Por mais feliz/ Está à altura/ Do que há por fazer”. Um desejo que, ela avalia no ano em que completa cinco décadas de carreira e sete de vida (em setembro), sempre a acompanhou:
— A coisa de que mais gosto, além de cantar, é correr riscos. Você só tem a ganhar quando se joga no abismo — diz, ecoando Dostoiévski. — Estava quieta quando veio o convite de Caetano para fazermos “Recanto” (2011), um disco ousado, que despertou em mim uma curiosidade com as coisas novas de hoje. Mas a radicalidade de “Recanto” é a mesma de “Cantar” (1974), que foi uma quebra para o disco de “Cultura e civilização” (“Gal”, 1969), que era radical também. E antes eu havia começado como uma bossanovista radicalíssima.
Gal vê o novo disco como outro “recomeço” — “Mais que ser prazeroso, recomeçar é natural para mim”, diz. Um movimento iniciado em “Recanto” — e que incluiu os shows “Espelho d’água”, de voz e violão, e “Ela disse-me assim”, com canções de Lupicínio Rodrigues.
— “Estratosférica” é uma continuidade daquele frescor jovem do “Recanto”, mas de forma mais palatável. Mais seguindo o “Recanto ao vivo”, que é mais aberto, aproximou o público — diz a cantora. — Queria a harmonia entre o radical e o palatável, entre o clássico e o ousado. “Sem medo nem esperança”, por exemplo, é um rock clássico. Já “Por baixo”, aquelas coisas libidinosas de Tom Zé quando fala de mim, é um samba, mas tem aqueles (faz sons ásperos com a boca, emulando o arranjo eletrônico)…
A cara de “Estratosférica” foi definida com a ajuda dos produtores Kassin e Moreno Veloso e do jornalista Marcus Preto, que fez a direção artística e de repertório. Clique aqui para ler mais.
1 Comentários
Lindo Lindo Lindo, parabéns Gal seja bem vinda a Musica, já estava triste com sua falta, musicas boas.