
Márcia Lage
50emais
Um dos ambientes mais moralmente insalubres onde já trabalhei é o Congresso Nacional. Sempre entrei lá como se entrasse num covil de lobos, e o episódio de achincalhe público da ministra Marina Silva na Senado comprova que nada mudou.
É uma casa de machistas de vários matizes, desde de deputados que apalpavam as alças de nossos sutiãs na época da Constituinte, até os que conversam com as jornalistas segurando o crachá delas, na altura dos seios, provocando um desconforto intimidatório. Sem falar dos mais escrachados, que acocham por trás as parlamentares na fila do microfone, para desestabilizá-las no discurso que ensaiam pronunciar.
Com jornalistas e assessoras parlamentares o assédio tem sempre uma rota conhecida: começa com convites para festas e jantares; evolui para sedução moral e ou/financeira; e termina com ameaças, insultos e deboches, no desespero alfa de conter uma mulher que se posiciona, que pensa e age com segurança e capacidade intelectual.
O jogo é tão eficaz e opressor que muitas mulheres desistem. A baixa representação delas na política (17,7% da bancada da Câmara e 16% da do Senado) coloca o Brasil numa posição vergonhosa.
A média da representação feminina nos congressos mundiais é de 26,4%. Paises como Cuba e México já alcançaram a equidade de gêneros.
Aqui, são poucas as que tentam a reeleição. Saem escaldadas do primeiro mandato. Difícil achar uma parlamentar que faz da política seu emprego vitalício, como acontece com muitos deputados e senadores.
O pior é que a misoginia que se pratica nesse país é aceita por tantas mulheres. Poucas reagem com bravura às investidas desrespeitosas desses senhores de terno e gravata. Esse silêncio, essa omissão, perpetuam atitudes ofensivas contra a maioria, no Congresso Nacional e nas ruas, onde a igualdade de gêneros nunca se concretiza.
O movimento feminista foi feito por mulheres e para as mulheres. Para que elas tivessem direitos equivalentes aos dos homens e fossem respeitadas nas escolhas que fizessem. Se a torcida contra vem delas próprias, é natural que os homens ainda nos vejam como simples objetos de agrado.
Podemos até ser eleitas. Só para cumprir cotas. Para andarmos bonitas e cheirosas pelos corredores do patriarcado, de sorriso nos lábios e voz mansa. Sem contra-argumentar ou contrariar os interesses dos lobos, que defendem com garras os benefícios do patriarcado.
As mulheres devem reagir como fez a ministra Marina Silva: anunciar bem alto que não se intimidam e que vão continuar avançando.
Quanto maior for a representação feminina na política, maiores são as chances de o Brasil se tornar um país sério. Porque, do jeito que está, dá é vergonha!
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