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Ruas vão se transformando em verdadeiras vitrines da miséria

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As pessoas passam e não veem Cezonita, cercada de caixas, sacos, mala, sacolas de plástico…

Maya Santana, 50emais

Quem anda estes dias pelas ruas do Rio fica sem saber de onde sai tanta gente desvalida. Em qualquer lugar que se vá, lá estão eles: dormindo debaixo das marquises, estirados nos vãos dos prédios, encolhidos em cima dos desconfortáveis bancos de madeira. Uns bem vestidos. Outros,trajados de pedintes. E são muitos, o que transforma a via pública numa espécie de vitrine da miséria. Cada um com seu drama.

Quando avistei Cezonita Lopes de Souza, foi o que me perguntei: qual seria a história dessa mulher magrinha, com boa aparência, que se mudou há mais de 10 dias, com todos os seus pertences, para um banco da Avenida Ataulfo de Paiva, próximo à Praça Antero de Quental, em pleno Leblon? O que me chamou a atenção, além da mala, foram os muitos sacos, sacolas de plástico e caixas de papelão ao seu redor. Tudo repleto. De quê? Só Cezonita sabe.

Perturbação mental
Assim que sentei para conversar com ela, constatei que, como outros moradores de rua, Cezonita sofre de problemas mentais. Contou que estava todos esses dias na frente da sede da Caixa Econômica, porque precisava pegar um cartão. Nada no seu jeito tranquilo, no bom português, indica qualquer desajuste, até que começa a falar. “Tenho mais de dois filhos. Três deles estudam na Aeronáutica e dois trabalham no centro da cidade.”

Veja ela aqui:

Casou-se duas vezes. E está “grávida de oito meses do meu segundo marido”, explica. Com sua calça jeans justa, camiseta branca, jaqueta preta e óculos escuros segurando os cabelos, Cezonita é uma jovem senhora elegante, sem barriga. Jamais poderia estar carregando uma criança prestes a nascer.

Dia e noite sentada em um banco de rua
O que será que teria acontecido para que terminasse fazendo da rua a sua casa? Ela diz que tudo começou na Avenida Visconde de Albuquerque, não muito longe de onde conversávamos. “Eu estava lá na minha casa. Mas ela foi ocupada. Meus filhos já foram lá investigar a invasão.”

Impossível manter um diálogo coerente com Cezonita, que diz ter morado em Bangu, Jardim Botânico, Niterói, São Fidélis “perto de Campos dos Goytacazes.” E a todo instante, lembra que nasceu no Leblon, mas nunca morou no bairro de classe média alta, onde agora passa seus dias e noites sentada num banco de madeira. Repete sem parar que, dali a pouco, ela vai embora. Mas não diz para onde. E assim está há quase duas semanas.

Rodeada dos muitos pertences, ela está sempre mexendo na sacola plástica alaranjada

Nas páginas da revista Playboy
Aparentemente, Cezonita precisa de atendimento psiquiátrico. Mesmo tendo se instalado com suas tantas tralhas em lugar movimentado, ninguém a vê. Ou finge que não vê. Afinal, o cenário urbano, tomado por excluídos, como essa senhora, incomoda e muito. Mais cômodo não prestar atenção.

Alheia aos olhos do mundo, ela continua a falar. E quando eu me levanto para ir embora, entra em um de seus delírios de grandeza, para contar, simulando contrariedade, que, um dia, se encontrava nua em casa, quando alguém a fotografou. Pega um saco plástico alaranjado e mexe lá dentro, antes de concluir: “As fotos foram parar nas páginas da revista Playboy.”

Outros flagrantes nas ruas do Leblon em julho de 2019:

O papelão serve de colchão, mas metade do corpo fica para fora
A coberta é curta e deixa o as pernas do casal à mostra
Aqui, o papelão sobra, mas não há nada para cobrir os corpos
Esse, com a bengala ao lado, tem um terrível problema na perna
Deitado no chão duro, sem anteparo, ao lado de um enorme vaso de flor
Eles vão se multiplicando e estão por toda parte
Vencida pelo cansaço, ela solta o corpo no desconfortável banco
O desconforto não impede que caia em sono profundo
A dura realidade obriga o jovem cidadão a dormir com o rosto encoberto
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