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Escritora Conceição Evaristo, no Dia da Consciência Negra: Desigualdade cresceu

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“O Brasil ainda está longe de ser um País pautado na justiça e direito à vida para todo”

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Neste Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, escolhemos para marcar a data essa entrevista da escritora, poeta, romancista e ensaísta, vencedora do Prêmio Jabuti de Literatura, em 2015, Conceição Evaristo, concedida a Sônia Racy, do Estadão. Com muitos livros publicados, a escritora se candidatou a uma vaga na Academia Brasileira de Letras, no ano passado, mas não levou. Conceição Evaristo, uma das vozes mais importantes do movimento negro no Brasil, acha que a mulher negra avançou em sua luta, mas “muito pouco.” Para ela, “O Brasil ainda está longe de ser um país pautado na justiça e direito à vida para todos.”

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Houve avanços significativos na luta das mulheres negras por mais visibilidade e representatividade?
Nos relembramos muito a frase que temos repetido: “Nossos passos vêm de longe”. Vem desde os navios negreiros. Conseguimos avançar, mas ainda é muito pouco. A nova geração tem muito por caminhar e o que nós conseguimos não foi presente. É resultado de lutas perenes, não ganhamos nada de graça.”

A desigualdade nas últimas décadas, só fez crescer. O Brasil está no caminho certo para diminuir esse fosso? Não, ele se aprofundou. Essa população pobre que nasce agora, o que pode esperar do futuro? Não é pessimismo, é um olhar atento para essa realidade. O Brasil ainda está longe de ser um País pautado na justiça e direito à vida para todos.

Qual é a sua opinião sobre a natureza do ser humano? Gosta de explorar isso nos livros?
Me chama atenção a solidão humana. Mas por outro lado, acho que ela também é aquilo que me permite ou que me leva a buscar o outro. Me abre para o pouso do outro em mim. Nos textos literários que tratam de personagens negras, essa condição fica esquecida.

Com seu talento, conseguiu espaço no mundo das letras. Hoje os escritores negros têm menos dificuldades em vencer?
Sinceramente, não sei. Hoje, para um escritor inédito, é menos difícil publicar. Em 1990, quando eu publiquei, tinha a editora Mazza, voltada para uma autoria negra. Paguei e consegui. Agora existem algumas editoras não negras que descobriram esse filão.

O mundo está mudando rapidamente, as mídias digitais tomam cada vez mais espaço. Como vê o futuro?
Não consigo prever, vejo mesmo é o presente. E esse presente é alentador porque teoricamente democratiza tudo. A mídia digital mágica, até meia milagrosa, a engrenagem toda. Para mim, isso é muito abstrato. Há uns anos, eu pensava: ‘Já pensou um telefone que a gente falasse com uma pessoa e enxergasse ela do outro lado?’ Pois é, aconteceu. Então, pra mim, o futuro está sendo agora.

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Quais histórias você quer contar daqui pra frente?
Temos belas histórias, poderíamos hoje criar uma ficção sobre um escritor ou uma escritora que consegue se afirmar no campo literário. E ela descobre que só escreve histórias de sofrimentos, e que quer escrever histórias de vitórias. O texto dela está tão viciado na dor, que tem dificuldade de encontrar outros motivos para a literatura. Talvez eu esteja pensando na minha própria experiência para desenvolver a temática.

O que mais te impactou na vida: ser pobre ou negra?
Bem criança, o impacto foi ser pobre. A partir do jardim de infância, as cenas começam a ser dolorosas porque eu era pobre e negra. A questão no Brasil não é só a questão social, é a social atravessada pela questão negra. Se chego numa loja já partem do pressuposto: ‘Será que essa mulher vai mesmo comprar alguma coisa?’ Ser negra e ser pobre são experiências impactantes.

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