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Homens que silenciam mulheres à bala

Apesar das boas intenções de governos, ONGs e movimentos sociais, o país ainda não sabe como lidar com esse flagelo. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

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São perturbadoras as estatísticas de feminicídio compiladas pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). O levantamento, com base nos dados das secretarias estaduais, registra 722 feminicídios no Brasil no primeiro semestre de 2023, maior número desde o início da série histórica, em 2019. Apesar das boas intenções de governos, ONGs e movimentos sociais, o país ainda não sabe como lidar com o flagelo.

O número representa um aumento de 2,6% na comparação com os 704 feminicídios no primeiro semestre do ano passado. Pode não parecer muito, mas o percentual esconde disparidades que demandam ação. No Sudeste, única região a apresentar crescimento nos casos, a alta foi de 16,2%, de 235 para 273. Das 27 unidades da Federação, 14 registraram mais feminicídios, 12 menos e uma manteve estabilidade. Na comparação, a maior alta percentual ocorreu no Distrito Federal (250%).

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O cenário esboçado no primeiro semestre acentua a tragédia de 2022, quando o país registrou 1.437 feminicídios, aumento de 6,1% em relação a 2021. A cada dia, em torno de quatro mulheres são assassinadas no Brasil em circunstâncias que envolvem violência doméstica, familiar ou discriminação. Tais números traduzem dramas relatados cotidianamente no noticiário. As histórias são parecidas: companheiros ou ex, inconformados com o fim do relacionamento ou com qualquer vestígio de independência, resolvem silenciar mulheres à bala.

Não há dúvida de que governo e sociedade têm agido para estancar a barbárie. As leis Maria da Penha, de 2006, e do Feminicídio, de 2015, são exemplos de aperfeiçoamento do arcabouço legal para coibir a violência contra as mulheres. A legislação se tornou mais rígida. Canais oficiais para denúncias de agressões foram criados, campanhas educativas se multiplicaram, movimentos sociais aumentaram a pressão sobre as autoridades.

Mais mulheres têm procurado o Judiciário para se blindar contra seus agressores. Segundo dados do FBSP, no ano passado foram concedidas mais de 1.200 Medidas Protetivas de Urgência por dia, aumento de 13,7% em relação ao ano anterior. Em tese, elas impedem que companheiros e ex-companheiros se aproximem das vítimas.

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Infelizmente, os números em ascensão mostram que as ações, embora louváveis, não têm sido suficientes para conter os crimes. Mesmo com Medidas Protetivas, mulheres são assassinadas. É preciso fazer mais. Primeiro, é essencial se debruçar sobre as estatísticas e agir onde o problema é mais agudo, uma vez que o aumento dos feminicídios não é homogêneo. Há estados que contribuem para elevar as estatísticas, caso de São Paulo, onde eles aumentaram 33,7%.

Além disso, é preciso incentivar as denúncias — em muitos casos, as vítimas não registram ocorrência ou não pedem Medida Protetiva — e melhorar a rede de acolhimento. É fundamental ainda adotar os programas bem-sucedidos, e não são poucos.

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As patrulhas Maria da Penha, que fazem rondas nas residências de mulheres ameaçadas, estão em curso em vários estados com bons resultados. No Rio Grande do Sul, a Justiça tem autorizado o uso de tornozeleiras eletrônicas para monitorar agressores. As mulheres ameaçadas recebem alertas pelo celular quando eles se aproximam. Soluções existem. O que não se pode é achar a epidemia de feminicídios algo normal.

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