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O bem que faz animal de estimação

Estudos recentes dizem que pessoas hiperativas, ansiosas e deprimidas devem ter gatos e não cachorros. Foto: Reprodução/Internet

Márcia Lage

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Animais de estimação são uma ótima companhia para todas as idades, dizem os estudos. Essenciais para crianças e velhos. Quem os cria sabe da felicidade que é chegar em casa e ser recebido por eles. Já tive inúmeros cães e gatos, e guardo deles carinhosas lembranças. Não sou dessas pessoas que humanizam demais os animais, põe para dormir na cama, veste roupinha no inverno, entram em depressão quando morrem. Acho que devem ser amados e respeitados na natureza deles, sem exageros.  Aprendi, com o tempo, que querem convívio e liberdade. Nada de confinamento e solidão.

Por isso, quando viajo, pago alguém para cuidar das minhas duas gatas, Gal e Elis, mestiças de siamesas abandonadas no terreno atrás da minha casa, e adotadas ainda bebês. Agora que não trabalho fora e tenho mais tempo para ficar em casa, percebo o quanto os gatos são inteligentes, amorosos e protetores.

Há um enorme equívoco sobre o comportamento dos felinos. Dizem que eles gostam da casa, e não dos donos, mas é pura invencionice de quem quer comparar dois seres completamente diferentes: os cachorros, que são extrovertidos e inquietos, e os gatos, calmos e calados.

Estudos recentes dizem que pessoas hiperativas, ansiosas e deprimidas devem ter gatos e não cachorros.  A quietude deles, a delicadeza dos movimentos, o ritmo da respiração e a independência afetiva criam um ritmo na casa que interage com os habitantes, equilibra o ambiente, acalma os ânimos, relaxa os espíritos.

Minhas gatas têm o poder de fazer isso tudo comigo, além de me deixarem mais amorosa, dedicada, compadecida. Quando saio para a rua, me esperam no portão, uma de cada lado, em perfeita simetria na disposição dos corpos, dois bibelôs de porcelana. É lindo e enternecedor.

Quando me ausento por muitos dias, encontro-as dentro de casa um pouco aflitas, como se tivessem sofrido intensamente o medo de novo abandono. Não fazem sujeira nem arranham os móveis, mas caçam passarinhos e deixam as penas no chão, numa tentativa de provar que são úteis, que fazem alguma coisa por mim além de darem despesa com ração.

O meu retorno as deixa tão felizes que passam o dia me seguindo para todo lado, me reparando, analisando meu comportamento. Entram na mala, cheiram as roupas, miam contando histórias. Entendo a linguagem delas. Sei interpretar os miados, saber se estão bem ou não.

Elas, também, sabem se estou alegre ou triste, se tenho algum problema e, principalmente, são o mais perfeito radar contra más companhias. Analisam a energia das visitas e, se forem do bem, interagem ou ficam na delas. Quando a energia não é boa, sobem para a escada e parecem emanar vibrações positivas. Se começarem a correr, a subir no sofá e a miar agressivamente, é sinal de alerta. Fazem tudo para expulsar o intruso, e depois insistem em dormir comigo, para me limpar de todo mal.

Normalmente durmo sem a companhia delas, por ser um pouco alérgica. Só deixo que subam em minha cama quando estão tristinhas, meio adoentadas ou carentes da minha prolongada ausência. Elas têm um sofá só delas, onde ficam durante o dia.

De noite, sobem para a escada e se põem de frente para o meu quarto, sempre atentas ao menor ruído.  Se vou ao banheiro ou desço à cozinha para tomar água, me acompanham imediatamente, sondando o que se passa, pois não tenho o hábito de levantar no meio da noite.

Quando durmo direto, às seis e meia em ponto começam a arranhar a porta do meu quarto. Miam baixo e fininho, mais pra rato que pra gato. E eu, nem aí. Aos poucos, vejo as patinhas forçando a abertura, e quando conseguem, entram sorrateiramente. Elis sobe na janela e fica de lá me olhando, com seus olhos de jade cheios de preocupação: “Será que está doente”?

Gal fareja meus cheiros debaixo da cama, os sapatos, o armário. Em silêncio, aguardam que eu me levante. Não consigo. Às seis e meia  ainda estou presa ao sono por finíssimas gotas de um líquido amniótico, em posição fetal no útero do meu mosquiteiro.

Então elas mudam a tática: a que está no chão pula para a janela. A outra se planta ao lado da cama, me encarando de baixo para cima, olhos de azul água, liquefeitos de ternura. Impossível não levantar.

Ainda pingando sono, desço as escadas com elas à frente, em saltos de alegria e viradas de cabeça, para se certificarem da minha presença. Ponho a ração nas vasilhas, troco a água, pego um copo para mim também e espero que comecem a comer, pois gatos só comem se observados.  Findo o ritual, volto para a cama, para terminar o sono interrompido.

Quando acordo de vez, elas me servem o dia.

 

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