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Os velhos salvarão o mundo

Turistas numa degustação em fazenda mineira. Foto: Osvaldo Afonso

Márcia Lage
50emais

Idoso é um jovem que deu certo. Li essa frase recentemente em alguma rede social. E ouso completar: são os velhos que salvarão o mundo de todo Apocalipse anunciado.

A geração 50+ tem no sangue a gana revolucionária e, no coração, a utopia da paz e do amor.

No Carnaval, encontrei vários desses sonhadores visitando projetos agrícolas bem sucedidos, com o propósito de deixar as cidades, superaquecidas e violentas, comprar terras e iniciar plantios de comida saudável, madeira certificada, árvores nativas em áreas degradadas, recuperar nascentes ressequidas.

Conheci um casal que atravessou a Mantiqueira de São Paulo a Minas, depois de aposentado, para produzir vinho nas altas serras, onde a amplitude térmica é favorável aos vinhedos.

Lorenzo e Elizama compraram as terras – na verdade uma montanha que quase encosta no céu – e começaram o negócio há cerca de cinco anos.

Plantaram uns mil pés de cada variedade de uva e, agora, estão criando vinhos artesanais com a paixão de alquimistas.

Sem se empenhar em ganhar dinheiro, mas já ganhando com simpáticas visitas aos vinhedos e degustação dos primeiros rótulos – o olfato na bebida e a visão esplêndida do pôr do sol junto às nuvens.

Do outro lado da cadeia de montanhas, uma família está produzindo os mais premiados azeites de oliva do Brasil.

Os pais começaram a plantar as primeiras mudas também depois de aposentados.

Os filhos modernizam o negócio, com automação do maquinário, aproveitamento da entressafra para produção de óleo de abacate, e visitas guiadas para o turista conhecer as espécies portuguesas, espanholas e gregas das azeitonas cultivadas na fazenda.

Durante uma dessas visitas, o jovem anfitrião apresentou um casal das imediações, que se dedica ao cultivo de cogumelos e produz pastas deliciosas para acompanhar os pães na degustação dos azeites.

O restaurante local faz parceria com outros produtores de doces, cafés e frutas, criando na região sudeste de Minas uma cadeia produtiva movida praticamente por aposentados e seus familiares.

Lorenzo cuidando do seu vinhedo nas terras altas de Maria da Fé. Foto: Márcia Lage

Essa energia contagiou um casal carioca, que se prepara para deixar o mercado de trabalho e iniciar uma nova etapa de vida no campo.

Eles pesquisam frutas vermelhas, pois querem cultivar mirtilo, amora silvestre, amora preta, de alto poder antioxidante, para o mercado de sucos naturais, doces e até cosméticos.

Unindo a folia e pesquisa, os “jovens que deram certo” aproveitaram os dias e as noites. Saíram nos cortejos de carnaval, bebendo cerveja e sambando, tão alegres quanto as crianças. Com a cabeça cheia de planos, sem nenhuma disposição para uma velhice apática.

A depender deles, o mundo estará salvo. Pelo menos, pequenos mundos onde a natureza será regenerada e, cheia de vigor, voltará a ser produtiva.

Os velhos que fizeram grandes revoluções culturais, políticas e sociais continuam à frente de novas batalhas.

Além de contribuírem para a reversão da crise climática, ainda sonham com a casa de campo para levar os amigos, os livros e os discos. Fazer o vinho e o pão.

Dar boas risadas. Sem medo ou vergonha de curtir a vida até o fim.

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