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Pela morte dos outros, vemos que estamos velhos

Ryan O’neal, o astro de Love Story (filme de 1970), morreu aos 82 anos, no dia 8 de dezembro de 2023. Foto: Reprodução/Internet

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Uma breve reflexão do escritor Inácio de Loyola Brandão, neste texto publicado pelo Estadão, sobre o nosso processo de envelhecimento. Como tudo se dá de maneira tão rápida que, quando a gente percebe, já envelheceu.

Eu, e com certeza tantas outras pessoas, me identifico com o que ele diz. Talvez porque a gente trabalha a vida inteira, corre para lá e para cá o tempo todo quando está na idade ativa, a vida passa sem nos darmos conta. E a sensação que fica é que foi tudo breve demais.

O escritor recorda que foi outro dia mesmo que assistiu ao filme Love Story. O protagonista, o ator Ryan O’Neal, morreu no dia 8 de dezembro último, aos 82 anos. E a inesquecível atriz que contracenou com O’neal no filme de 1970, Ali MacGraw, está com 84.

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Certa manhã de 1970, mensagens correram pelas redações da Abril na Rua João Adolfo, centro de São Paulo. Convocando: “Sessão de Love Story, às 10 horas no cine Metrópole”. Não havia celulares, computadores, rede social, era tudo pelo telefone.

A editora esvaziou. Caminhamos duas quadras e nos posicionamos nas filas gigantescas. Tinha sido avassaladora a promoção do filme. Tanto que a certa altura rolaram sessões contínuas, noite e dia. O filme chegou embalado pelo sucesso da canção, cantada por Andy Williams.

Todos sabiam a letra que provocava lágrimas: “Where do I begin. To tell the story of how great a love can be”. Logo veio a versão em português, com Wanderley Cardoso. Saibam que a canção Love Story, criação de Francis Lai, nada tem a ver com a atual Love Story de Taylor Swift e sua imensidão de seguidores.

Foi impossível conter as lágrimas, quando Ali MacGraw morreu. No filme, claro. Ainda está viva, com 84 anos. Para mim ela continua a ter a idade que tinha quando fez o filme. Como esquecer a frase que viralizou? “Amar é nunca ter de pedir perdão.”

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Um lugar-comum, clichê. Repetida milhões de vezes, até se esgotar. Se hoje eu disser a sério a frase, serei cancelado. Ouvirei uma gargalhada ou eu mesmo vou rir de mim. Repeti-la agora nos envergonha.

Envelhecer, entre outras, é não perceber a mudança do tempo, as mutações. Vemos pela morte dos outros que estamos velhos. Ryan O’Neal (morto no dia 8 de dezembro de 2023) com 82 anos. De repente? Foram décadas e décadas.

Vejam só as que passaram pela cama dele: Ursula Andress, Bianca Jagger, Anouk Aimée, Jacqueline Bisset, Barbra Streisand, Joan Collins, Diana Ross, Anjelica Huston (que o acusou de assédio), Melanie Griffith, Farrah Fawcett. Tinha fôlego.

Ali MacGraw, 84, que ganhou o mundo com sua interpretação em Love Story. Foto; Reprodução/Internet

Envelhecer é levar susto, depois rir. Envelhecer mal é não absorver o que se cria e se recria a cada instante. Terminada a lacrimejante sessão fomos para o bar do hotel Cambridge, que ainda mantinha resquícios de grande luxo. O club sandwich foi criado ali.

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Hoje, o lugar está ocupado por famílias em situação de rua. Naquele hotel, final dos anos 1950, entrevistei a superstar sensual Jane Russell. Lembrando dela ao lado de Marilyn Monroe em Os Homens Preferem as Loiras. Um megassucesso.Depois andamos pela avenida para uma foto diferente. Nem sei como a convenci a caminhar.

Bom ter vivido esses momentos. A felicidade de fazermos o que gostamos.

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