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Aos 77, voltando sozinha de Londres, ela conta: ” Vivi uma experiência diferente”

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A autora tem dificuldade de locomoção. Por isso se vale de uma bengala. Foto feita pouco antes de sair para o aeroporto

Ana Maria Cavalcanti*
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Vou com frequência  a Londres, cidade onde vivi 16 anos. Conheço como a palma da mão os corredores do aeroporto de Heathrow e seus procedimentos. Mas desta vez, vivi uma experiência diferente. Para começar, cheguei de bengala e fui encaminhada, gentilmente, para uma fila mais rápida. Logo estaria na casa de uma amiga. Depois de duas semanas, voltei ao Brasil. É desta volta que quero falar.

Logo ao desembarcar do trem expresso que liga a estação de Paddington, na região central de Londres, ao aeroporto de Heathrow, o mais movimentado da Europa, em 15 minutos, dois funcionários do aeroporto vieram me ajudar a tirar minhas duas malas do trem. Em seguida, perguntaram se eu precisava de alguma assistência. Não sabia bem do que se tratava, mas estava claro que iriam ajudar a chegar ao portão de embarque. Aqui começou a aventura.

Primeiro chamaram um outro funcionário que me colocou em uma cadeira de rodas. Passamos por alguns corredores e, como já tinha feito o check in online, tive apenas que pesar minhas malas e mostrar meu certificado de vacinação. Eu sempre sentadinha, no conforto de uma cadeira de rodas. Ai veio uma uma jovem também indiana, simpática que assumiu o comando da operação.

O aeroporto de Heathrow, em Londres, é o terceiro mais movimentado do mundo. Foto: Internet

Andamos mais um pouco e paramos no espaço de assistência, onde já estavam dezenas de pessoas, todas esperando para embarcar.

Enquanto esperava, olhei em volta: muitas africanas com trajes típicos, senhoras e senhores em idade avançada que não andavam mais. Outras, como eu, precisavam mais de ajuda com a bagagem de mão para chegar até o avião. Uma delas, sentada a meu lado me impressionou.  Não  deveria ter mais que metro e meio de altura e, sentada,  os pés nem  tocavam no chão, parecia uma criança. Magrinha, bem vestida,  branca de olhos azuis muito vivos, deveria ter uns 90 anos, ia para a Alemanha, viajando sozinha, como eu.

O tempo foi passando, gente chegava, gente saia. E ninguém vinha me apanhar. Fui ficando aflita e por duas vezes perguntei ao funcionário que gerenciava o local, o que estava acontecendo. Queria ter certeza de que não ia perder meu vôo.

Da última vez que olhei para o painel de embarques, me assustei: meu vôo já estava fechado. Mas o funcionário dizia para eu não me preocupar. Dali a pouco, chegou um daqueles carrinhos movidos a eletricidade que andam para cima e para baixo nos aeroportos para apanhar mais passageiros. Finalmente tinha chegado a minha vez, entrei, entraram mais quatro pessoas. Nossa bagagem de mão foi colocada em um compartimento ao lado.

Área do aeroporto de Heathrow reservada às pessoas com dificuldade de mobilidade. Foto: Internet

Fui deixada dentro do avião. A distância de onde eu estava, um reservado ao lado do Duty Free, para o portão 42 de onde sairia meu avião, era imensa. Leva 20 minutos para ser percorrida a pé, segundo aviso no aeroporto, o que corresponde a mais de um quilômetro de distância. Um cansativo percurso até para os mais jovens. Imagine eu, com 77 anos, andar todo o caminho carregando uma maleta com 10 quilos!

Fui deixada dentro do avião. Jantei e depois fui deitar em quatro assentos que estavam vazios. Cheguei a São Paulo, com o dia amanhecendo. Gosto de viajar e gosto de voltar para minha casa. Cheguei cansada, mas feliz da vida. Bom saber que, mesmo andando devagar, ainda posso ir longe.

*Ana Maria Cavalcanti é jornalista. Trabalhou durante muitos anos na BBC, em Londres

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