Maya Santana, 50emais
Uma delícia esta crônica do jornalista e escritor Zuenir Ventura sobre a artista plástica carioca Thereza Miranda, que está completando 90 anos em plena forma, não só artística, mas física mesmo. Primeiro, o autor fala do envelhecimento rápido da população brasileira. Daqui a 13 anos, segundo estatísticas oficiais, o número de brasileiros com mais de 60 anos será maior do que o de jovens com menos de 15 anos. Depois, concentra-se na artista, que conserva a boa forma comendo pouco.
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Alguns dirão que se trata de uma coluna em causa própria — a dos velhos. Pode ser. Afinal, o tema está na moda. No próximo dia 21, haverá aqui no jornal o seminário “Envelhecimento além das rugas”, com a participação de uma dezena de conhecedores do assunto. Na semana passada, houve aquele anúncio em tom de calamidade de que o Brasil está envelhecendo rapidamente e daqui a 13 anos seremos maioria (“seremos” é mania de grandeza, pois em 2031 eu não serei e, sim, seria um ancião de quase 100 anos).
Melhor dizendo então: a população de velhos vai superar a de crianças e adolescentes, retardando o desenvolvimento do país, que disporá de um número de aposentados superior ao de jovens no mercado de trabalho. Diante disso, já que somos considerados um estorvo, tenho o prazer de apresentar-lhes uma personagem que desmente o estereótipo do idoso como empecilho. É um exemplo edificante. Trata-se da desenhista, pintora e gravadora Thereza Miranda, uma de nossas mais premiadas artistas plásticas, que acaba de comemorar seus 90 anos com uma exposição na companhia do grafiteiro Bruno Big, um discípulo com a metade da idade dela.
Parecia um teste de popularidade. Foram quatro horas de entra e sai de umas 300 pessoas de várias idades, com destaque para os jovens. Professora da PUC há 44 anos, ela deveria ter-se jubilado em 1974, mas um abaixo-assinado com mais de mil adesões não permitiu, “obrigando-a” a prosseguir com suas aulas de gravura — metal e xilo — no Departamento de Artes e Design às sextas-feiras, das 7h às 13h.
Nos outros dias, ela segue acordando cedo, mas para as caminhadas diárias de cinco quilômetros no calçadão de Ipanema. À noite, costuma ir ao cinema ou ao teatro, que frequenta desde jovem, quando era assídua do Tablado, de Maria Clara Machado. Tudo isso quando não há jogo do Botafogo, “o meu Fogão”, uma de suas paixões. Nesses casos, vamos encontrá-la sem falta no Estádio Nilton Santos com seu filho e os netos. A rotina anual é desfilar pela Mangueira, como faz há 20 anos.
Mas do que Thereza gosta mesmo é cultivar as amizades. “Elas são tudo na vida.” Uma delas não estava no vernissage e a inesperada ausência teve que ser justificada. É que Fernanda Montenegro, companheira de programas, se encontrava em São Paulo a trabalho, mas no domingo anterior ajudou a organizar um almoço surpresa para a aniversariante.
Um dos mistérios de Thereza é sua ubiquidade, a capacidade de estar em vários lugares ao mesmo tempo. Há dias, participou de um jantar de aniversário. Duas horas depois, às 23h, pediu licença para sair mais cedo: tinha outro compromisso.
Ela mantém sua boa forma comendo pouco, mas por amizade é capaz até de jantar duas vezes.