Elisa Santana, 50emais
Nas minhas lembranças de menina, a minha mãe, canceriana, era uma mãe que lavava, passava, costurava, cozinhava, cuidava para que não brincássemos na rua, não fôssemos mal educados com ela, com os mais velhos e nem faltássemos às aulas… Não me lembro de estar no colo da minha mãe, que teve 12 filhos. Parte da carência que me acompanhou muito tempo veio deste fato. Achava que ela não me amava e eu era ( e sou) louca por ela. Gastei a adolescência e parte da juventude até que compreendesse que ela me deu o de mais verdadeiro nela. Do jeito dela, me amou sim e muito. Alguém conhece canceriana que não gosta dos filhos? Eu ainda não. Sei que este amor não tenha a ver com signos, sou leonina e amo a minha filha.
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Desde nova queria ter filhos. Uma filha. Escandalizava a minha mãe quando, com apenas 20 anos, dizia que ao completar 28 anos, se não tivesse me casado, teria uma filha. Ela, de sabedoria infinita, não arrancava os cabelos. Só dizia: “Você fala tudo errado, mas faz tudo certo.” Óbvio que ela ficava morta de medo. Imagina uma cidade do interior mineiro, com 15 mil habitantes, no final da década de 70. Meu pai e ela eram muito conhecidos, como pessoas sérias e boa gente e uma filha que dizia coisas fora da moral vigente, se assemelhando às pessoas loucas, “da vida” ou sem “eira e nem beira?”
Fiquei grávida aos 38 anos. Por gosto, por querer, por escolha. Quando fiquei grávida e corri para contar a minha mãe, ela só me disse “Você ainda não viu a cor da chita”, referindo-se ao trabalho que eu teria com aquela criança. Queria que ela tivesse me acolhido, me abraçado, mas não me importei. Não me importei mesmo, porque, para mim, começou um tempo de graça e alegria. Nada me abalava, passei pouquíssimo mal, ria de tudo e um dia, já muito próxima de minha mãe, brinquei com ela: “agora sei por que a senhora vivia grávida.” Ela riu e confirmou: “Foram os melhores momentos de minha vida”. Rimos juntas. No que eu emendei: Agora eu entendo o ”Ave Maria, cheia de Graça.” Ela parou, me olhou admirada e disse “Olha! vivendo e aprendendo.” A partir daí, a gente se tornou ainda mais amigas.
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Quando Joana ( é assim que minha filha se chama) nasceu, eu nunca havia conhecido tanto amor. Chorei todo o tempo e o tempo todo pensando que eu deveria ter tido dois filhos, era amor demais para uma filha só. Se já a amava na barriga, fora, o amor triplicou. Levamos uma infância, ela e eu, cantando, brincando de roda, andando no mato ( nesta época morávamos em um sítio), em volta de lagoa, subindo em árvores, gangorrando, gozando da presença de sapos, aranhas, lagartos, cachorros, coelhos, Sol,peixes, estrelas, aproveitando o céu e os amiguinhos que, agora moça grande, não esquece.
Aos 5 anos ela me disse algo que nunca esqueci. Ao chamar sua atenção por algo que agora não me lembro, eu lhe disse em tom reprovador: “Ô minha amiga, o que é isto?” No que ela me respondeu: “Você não é minha amiga. Você é a minha mãe.” Guardei esta fala para sempre.
Na adolescência, ela também me disse algo que nunca esqueci: “ Não se preocupe, mãe, você é a melhor mãe do mundo.” Já adulta, discutindo comigo, ela me disse algo que não me preocupo em me lembrar: ”Mãe, você tem certeza que queria ser mãe?” Na hora, fiquei sem chão. Mas, depois, me lembrei que numa certa época perguntei algo parecido para minha mãe, e ela, sem graça, no seu desajeito , tentou me dizer que sim, que me amava.
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A vida me mostrou o amor dela por mim. O que a mãe aparentemente não ensina, a vida ensina. Acho que os filhos, numa certa época, sempre desconfiam das mães. Alguns têm razão, outros só estão procurando o caminho melhor da estrada, que é longa e que não precisa ser deserta. O que sei é que as mães só se tornam mães porque os filhos existem. Eles são aprendizado sempre. Desapego. Afinal, os filhos não são só nossos. São, principalmente, deles também. Aposto sempre nas boas mães para que eles, os filhos, sejam melhores ainda.
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