Márcia Lage, 50emais
O que denuncia nossa idade não são os cabelos brancos (que os tingimos) nem as rugas (que o botox está cada vez mais acessível) nem a pele flácida (que a musculação faz milagres). É o atraso tecnológico que nos roubará o investimento em “juvenização”, escancarando nossa idade mais do que uma certidão de nascimento escrita à mão.
E não adianta empacar feito burro velho e dizer: não quero, não preciso, já estou fora do mercado de trabalho, isso é alienante, veja a juventude, completamente fora de si teclando o dia todo no celular e blá blá blá, blá blá blá! Só a ranzinzice do empacamento já denuncia que nascemos no século passado, lá bem embaixo no formulário eletrônico, que procuramos com o cursor.
Dá até canseira pensar nos inúmeros “upgrades” que tivemos que fazer em nossa máquina, desde que começamos a enfrentar os desafios tecnológicos, que foram surgindo paulatinamente em nossa juventude. Aprendemos a datilografar em máquinas de escrever, o que nos levou a ser muito rápidos nas elétricas. Mas, logo, tivemos que reaprender tudo nos teclados dos computadores, e quando o mouse ganhou destreza em nossas mãos, vieram os teclados digitais dos “laptops” e “tablets”. Agora, só precisamos dos polegares para dominar a escrita, e com um celular de última geração o mundo vem a nós muito rápido.
Falando em celular, quem se lembra do Bip? Era um aparelho “revolucionário” usado por médicos, policiais e jornalistas, entre outros escravos do trabalho, nos anos 1980. Ligado a uma central de telefonistas, transmitia recados. Um ancestral do “Messenger”. Com a chegada dos celulares no Brasil, a partir dos anos 1990, a quase natimorta tecnologia soa ridícula. Os primeiros celulares pesavam quase um quilo, e à medida que reduziram de tamanho cresceram em utilidades, tornando obsoletas invenções recentíssimas, como os tais “laptops” e”tablets”, transformados em simples máquinas de escrever.
Isso para nós, as tartarugas da tecnologia digital, pois já conheci jovens que redigem poesias e romances em seus “Smartphones”, editam, ilustram e publicam. Isso eu ainda não domino, e devo estar desatualizadíssima com o meu singelo “Iphone 5S”, que me custou um terço da aposentadoria, mas aposentou para sempre a minha câmera fotográfica digital, o Banco, os jornais, os livros de receita, os dicionários, o relógio de parede, o despertador, a calculadora, a folhinha Mariana, a astróloga, o nutricionista, todos os mapas, os guias de turismo e o toca-discos (ou que nome tenha tido essa coisa desde que foi inventada por Thomas Edson, em 1877, até sair do mercado muito recentemente, levando com ele os discos, os CDs, o rádio e até os MP3, 4, 5 e 6).
E ainda resisto: não leio livros eletrônicos nem tenho “E-Readers”, os tais aparelhos que fazem crer que estamos lendo um livro de papel, com marcadores de texto, viradas de páginas, etc…não, ainda estou com Gutemberg. Leio à moda antiga. gosto do papel ainda. Também não assisto TV no celular, não jogo “Candy Crush” nem caço “Pokérmon”. Acho que posso passar sem isso, mas entendo cada vez mais que tenho que me adequar a um mundo sem telefone fixo, sem atendente humano em quase todos os serviços públicos e privados, sem talões de cheque ou dinheiro de papel. Entendo, também, só pelo tanto de aspas nesse texto, que sem o domínio do inglês não sobreviveremos nesse mundo cuja torre de Babel se endireita pelas mãos milagrosas do Deus Digital.
Ai de nós, velhinhos sarados e charmosos, se não pedirmos ajuda cada vez mais aos nossos sobrinhos e netos para entendermos esse tempo que não para de nos surpreender (ou amedrontar). Por causa dos avanços tecnológicos estou tendo que desenvolver uma virtude: a paciência, que sempre me faltou. Agora, preciso achá-la dentro de mim para baixar aplicativos, pagar contas, reclamar dos serviços e fazer atualizações, lendo tudo de cabo a rabo, decifrando siglas, setas e sinais, traduzindo termos em inglês e abaixando o tom de voz para não ferir os direitos do infeliz que trabalha nos “Call Centers” de tudo o que existe para nos fazer desistir dos nossos próprios direitos.
Também estou tendo que expandir uma capacidade nata, a curiosidade. É ela que nos tornará cada vez mais íntimos dessa avalanche de novidades, que nos fará melhores ou piores, a depender do uso que fizermos da tecnologia. Eu fico satisfeita em aprender o que não tem mais jeito de não aprender, e de utilizar o que me economiza tempo, dinheiro e espaço, como os aplicativos de música e de serviços. Não vou me viciar, detesto ser dependente de qualquer coisa. Só vou dar uma olhadinha agora no “Facebook”. Só por hoje, só por hoje. Eu prometo.