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A história de Laura de Oliveira é a maior prova que, para se desfrutar de uma velhice tranquila e saudável, é fundamental a prática de uma série de atividades. É impossível envelhecer bem sem se mexer, não só fisicamente, mas mentalmente também. Por isso ela, além de praticar com regularidade natação, não descuida dos exercícios para manter a mente sempre ativa. Dá grande prazer ler sobre a rotina dessa senhora admirável.
Leia a reportagem de Bárbara Therrie para o Uol:
Aos 102 anos, Laura de Oliveira, de Belo Horizonte (MG), diz que o DNA é um fator importante para ela ter se tornado uma centenária —a mãe dela morreu com quase 100 anos, ela tem uma tia-avó com 106, e duas irmãs, uma com 95 e outra com 98. Além disso, dona Laurinha, como é conhecida, afirma que a ginástica cerebral é fundamental para se manter ativa durante o envelhecimento. A seguir, ela conta as atividades que faz e como começou a nadar aos 70 anos, virou atleta e pratica o esporte até hoje.
“Sempre fui uma pessoa ativa, desde criança era uma menina muito levada, nasci e fui criada numa fazenda, subia em árvores, nadava no rio. Quando me casei, virei dona de casa, cuidava dos filhos e ajudava meu marido nos negócios —fiquei viúva aos 42 anos e nunca mais me casei.
Depois que meu marido morreu, criei um hábito que adoro e tenho até hoje, fazer palavras cruzadas, é um estimulante para a minha cabeça. Faço a recreativa porque é umas das mais difíceis, estimula minha mente, me obriga a raciocinar e a pensar nas palavras, o que é positivo porque aprendo novas palavras e aumento meu vocabulário.
Outro lado bom é que preciso lembrar as palavras, o que me ajuda bastante na memorização. Minha memória está melhor do que a das minhas filhas e netas. Tem uma neta que fala que gostaria de ter 50% da minha memória.
De vez em quando esqueço algumas coisas, como o nome de um ator, por exemplo, mas sei o nome dos meus 7 filhos —um já morreu— dos meus 16 netos e 21 bisnetos. Sei a data de aniversário, de casamento deles, lembro o que cada um me deu de presente. Faço palavras cruzadas todos os dias, quando tenho um tempo livre e quero distrair minha mente, mas também quando estou aborrecida. É um vício bom na minha vida.
Além da revistinha tradicional, também gosto de fazer as palavras cruzadas do programa do Silvio Santos, adoro esse quadro, me divirto e aprendo bastante. Outro quadro legal é o “Quem Quer Ser um Milionário”, do Luciano Huck. Ele faz perguntas de conhecimentos gerais aos participantes, não estou no programa, mas participo de casa.
Não sou muito de assistir à TV, geralmente assisto a esses programas que são mais educativos, que desafiam nosso conhecimento e trabalham a memória. Não gosto das novelas atuais, gostava mais daquelas que contavam as histórias do passado. Gosto de ver futebol e torço para o Cruzeiro, Atlético Mineiro e América, os três times que meus filhos torcem.
Também jogo o quebra-cabeça Sudoku, estimula a lógica e o raciocínio, mas acho muito fácil, preencho os quadrados com os números bem rápido, o que acaba perdendo a graça, então prefiro fazer atividades mais difíceis. A leitura também é importante para manter o cérebro funcionando, eu gostava de ler livros de romance e aventura, mas parei depois que fiz duas cirurgias para catarata e a vista não ficou tão boa.
Aos 65 anos comecei a fazer ioga para movimentar mais o corpo, mas foi aos 70 que uma porta maravilhosa e cheia de coisas boas se abriu para mim por meio da natação. Nessa época morava com a minha caçula, que é psicóloga. Ela achou que eu estava um pouco triste e deprimida e me incentivou a aprender um novo esporte. ‘Mãe, vamos aprender a nadar’, ela disse.
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Ela nos matriculou no clube e começamos a fazer as aulas. Eu era nadadora de rio na infância, não colocava a cabeça dentro d’água e não sabia nenhuma técnica. Depois de um tempo, minha filha parou, mas eu gostei e continuei. Fazia aulas quatro vezes por semana.
O professor viu que eu tinha muita energia para minha idade, 70 anos, e muito potencial. Ele passou a me treinar e logo depois comecei a participar de várias competições. Na primeira, já ganhei ouro. Tenho inúmeras medalhas e troféus, viajei quase o Brasil todo competindo. Também recebi uma homenagem do Barroca Tênis Clube, em Belo Horizonte, que colocou o meu nome no parque aquático deles, Parque Aquático Laura de Oliveira.
Nado peito, costas e livre. Em 2019, aos 100 anos, me tornei recordista mundial nos 50 m peito na categoria 100-104 anos. A natação foi excelente para a minha mente e corpo, trouxe luz, amor, disposição e muitas amizades especiais, ganhei uma nova família nesse esporte.
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Quando comecei a fazer natação, fui morar sozinha, sempre fui independente e não queria atrapalhar meus filhos. Até hoje moro sozinha, mas tenho uma moça que vem uma vez por semana fazer a faxina pesada. Eu lavo o banheiro, louça, minhas roupas, varro, não com a mesma agilidade de antes, mas faço. Também cozinho uma ou outra comida. Minha alimentação é normal, como comida de verdade, arroz, feijão, carne, verduras e legumes à vontade, massas.
Parei de competir, mas continuo nadando quatro vezes por semana. Além da natação, já pratiquei outras atividades, como crochê, bordado, costura, pilates, ginástica e zumba.
Uma outra coisa muito boa para a mente é a socialização, adoro teatro, festas e estar junto com os amigos e com a minha família que é muito amorosa. Gosto de dançar, sou a primeira a chegar e a última a sair das festas. Mesmo na pandemia, não fiquei e não gosto de ficar parada, estou sempre procurando algo para fazer, caminho dentro de casa, tomo bastante sol na varanda e vou para o sítio de um dos meus filhos. Quando estou lá, gosto de pescar, já fui campeã de pescaria.
Não gosto de tecnologia, ela cansa minha cabeça. Tenho um celular que uso só para fazer ligações, se preciso de alguma coisa em relação a isso, alguém da minha família me ajuda. Prefiro gastar minha energia com as atividades manuais que me dão prazer.
Já sofri alguns acidentes domésticos, aos 90 anos fui atropelada por um motorista que entrou na contramão. Em todas as situações me recuperei bem. Não tenho nenhuma doença, não tomo remédio e faço check-up todos os anos. Sou uma pessoa privilegiada e abençoada por Deus.
Não me sinto velha, sou uma jovem de 102 anos. Sempre gostei de aprender coisas novas, estimular o cérebro ao longo da vida é fundamental, especialmente quando a gente vai envelhecendo. Ser ativo fazendo o que gosta é benéfico para o corpo e para a mente, é a mola que nos faz rodar para nos manter vivo, saudável e feliz.”
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