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Se a ciência já permitisse, você gostaria de viver 200 anos? Até acredito que os cientistas vão conseguir alargar muito a longevidade humana, mas, pessoalmente, eu não gostaria. Se chegar aos 90, com saúde, principalmente, estarei satisfeitíssima. Há muita gente, no entanto, que daria tudo para empurrar a morte cada vez mais para a frente. Nunca se estudou tanto como agora formas de prolongar a vida. Quem financia esses estudos é gente poderosa, como Jeff Bezos, da Amazon, e Sergey Brin e Larry Page, donos do Google. algumas das pesquisas nesse campo já estão avançadas, como você vai ver nessa reportagem de Giulia Vidale para O Globo.
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O espanhol Juan Ponce de León fez sucessivas expedições no século XVI à procura da fonte da juventude. O imperador chinês Qin Shi Huang, o primeiro da dinastia Qin, tentou alcançar a imortalidade ao ingerir pílulas de mercúrio há 2 mil anos. A vida eterna é um desejo que acompanha a humanidade desde seus primórdios. Graças aos avanços da ciência e investimentos bilionários inéditos, a ideia de frear ou ao menos retardar o envelhecimento parece estar mais perto de se tornar realidade.
Fundadores de grandes empresas de tecnologia, como Jeff Bezos, da Amazon, Larry Ellison, da Oracle, e Sergey Brin e Larry Page, do Google, estão investindo bilhões de dólares em pesquisas biomédicas.
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A mais recente empreitada nessa busca se chama Altos Labs, uma startup no Vale do Silício, na Califórnia. A empresa já nasceu com um investimento de US$ 3 bilhões, três laboratórios – sendo dois nos EUA e um no Reino Unido – e um time dos sonhos de pesquisadores, incluindo diversos ganhadores do prêmio Nobel. Entre seus investidores estão Bezos e o bilionário russo-israelense Yuri Milner. Sua principal aposta é uma técnica chamada reprogramação celular. Em laboratório, ela se mostrou capaz de rejuvenescer células.
A mesma velha história
O envelhecimento não é só o acúmulo de aniversários e o aparecimento de rugas e cabelos brancos. Tudo isso é consequência de um processo natural do corpo humano, que ocorre em nível celular. Com o passar do tempo, as células se dividem menos. Nossos cromossomos se contraem e se quebram, os genes ligam e desligam ao acaso, as mitocôndrias se decompõem, as proteínas se desemaranham ou se aglomeram, as reservas de células-tronco regenerativas diminuem, os ossos se afinam, os músculos perdem força, os órgãos tornam-se lentos e disfuncionais, o sistema imunológico enfraquece e os mecanismos de auto-reparo falham.
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Nas últimas décadas, o desenvolvimento de remédios e vacinas, o saneamento básico, o cuidado com a alimentação e a prática de atividade física aumentaram consideravelmente a expectativa de vida humana. Entre 1990 e 2015, o número de centenários no mundo quintuplicou, chegando a 450 mil pessoas. No entanto, apesar de todos os avanços da medicina, ninguém foi capaz de superar o recorde da francesa Jean Calment, que faleceu em 1997, aos 122 anos. Ao menos até agora. As principais apostas hoje para estender a expectativa de vida buscam atuar no nível genético e molecular.
— Se realmente entendermos a biologia e pudermos redesenhar os humanos da maneira que na teoria é possível, então não haverá limites biológicos para a longevidade — diz o biológico português João Pedro de Magalhães, líder do Laboratório de Genômica Integrativa do Grupo de Envelhecimento da Universidade de Liverpool, na Inglaterra.
Vários caminhos
A reprogramação celular, principal aposta da Altos Labs, por exemplo, consiste em aplicar uma técnica desenvolvida por Shinya Yamanaka, vencedor do Prêmio Nobel de Medicina por por seu trabalho com células-tronco.
Outra abordagem promissora visa eliminar as células senescentes. Quando as células são danificadas por toxinas ou radiação, elas entram em um processo conhecido como senescência. Esse processo ajuda a evitar o aparecimento de tumores. Por outro lado, o acúmulo dessas células libera substâncias que aumentam a inflamação. Isso, por sua vez, impulsiona doenças associadas ao envelhecimento.
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Evidências preliminares indicam que drogas que destroem células senescentes não apenas melhoram as capacidades físicas de camundongos idosos, mas também prolongam sua vidal. Mais de uma dúzia de ensaios clínicos estão em andamento visando evitar doenças como Alzheimer.
O rejuvenescimento do sistema imunológico é mais uma possibilidade de atuação. À medida que envelhecemos, nosso sistema imunológico enfraquece, deixando-nos mais propensos a doenças. Parte disso é impulsionado por mudanças no timo, uma glândula localizada entre os pulmões. Estudos iniciais indicam que um hormônio do crescimento, tomado com dois medicamentos antidiabéticos, pode regenerar o timo. A expectativa é que uma terapia baseada nessa abordagem possa ajudar a prevenir o câncer e infecções.
Não corra ao laboratório
A transfusão de plasma de pessoas jovens também é um caminho possível. A proposta ganhou os holofotes em 2018, quando a startup Ambrosia passou a oferecer o serviço como parte de um estudo. O aumento do interesse fez com a que a Food and Drug Administration (FDA), agência que regula medicamentos nos EUA, emitisse um comunicado alertando que não há benefício clínico comprovado no procedimento.
Como em toda pesquisa médica, não há garantia de sucesso. Vale lembrar que a transfusão de plasma convalescente com alto nível de anticorpos foi considerada um tratamento promissor para a Covid-19, mas, nos testes clínicos, ela se mostrou inócua.
Para a geneticista Lygia Pereira, líder do projeto DNA do Brasil na Universidade de São Paulo (USP), é promissor o fato de algumas técnicas terem funcionado em camundongos. No entanto, ela ressalta que a biologia humana é muito complexa. Muita coisa pode não ter bons resultados quando aplicada em pessoas.
Quantidade versus qualidade
A professora do departamento de bioquímica da USP, Alicia Kowaltowski, que atua como cientista na área de metabolismo energético, chama atenção para a importância de aumentar o período de vida saudável e não simplesmente estender a expectativa de vida a qualquer custo. O conceito é conhecido como healthspam e é a nova meta no Japão, país que atualmente ocupa o primeiro lugar no ranking da longevidade.
— Gostaria que evitássemos ao máximo doenças relacionadas à idade — diz.
E qual seria o limite para a longevidade humana saudável? Um estudo recente publicado na revista Nature Communications indica que podemos viver, no máximo, até 150 anos. Entretanto, há uma corrente de pesquisadores que acredita que não haja limite. Teoricamente, qualquer organismo com suprimento contínuo de energia e capacidade suficiente de automanutenção e reparo poderia viver infinitamente.
— Sim, existem limites biológicos para a vida humana. Mas dizer isso é como dizer que há um limite para o quão alto conseguimos pular ou então que não somos capazes de voar. Realmente, não podemos voar. Mas podemos construir aviões e usá-los para voar. Isso significa que podemos usar a tecnologia para superar nossos limites biológicos e viver vidas mais longas e saudáveis — diz o biólogo João Pedro de Magalhães.
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