Miriam Moura
50emais
A leitura é um exercício solitário e muitos leitores asseguram que o hábito de ler é recompensado com boa dose de prazer. O professor e grande crítico literário americano, Harold Bloom, prescreve que “ler nos conduz à alteridade, seja à nossa própria ou à de nossos amigos, presente e futuros. Literatura de ficção é alteridade e, portanto, alivia a solidão”.
O escritor argentino Jorge Luis Borges, um gênio singular da literatura mundial, tinha um certo fetiche pelo livro escrito, e gostava de descrever o prazer tátil de tocar os livros com as mãos.
O encontro de Borges com a escrita passa por sua experiência radical com a leitura, como afirmou certa vez em entrevista à The Paris Review, aos 67 anos. Para ele, as pessoas deveriam ser capazes de ler com fluência. Em suas obras-primas, sempre preferiu usar palavras comuns. “As ideias, boas ou más, devem ser expressas de forma clara para o leitor”.
A leitura é um hábito que exige certa disciplina. Mas quem cultiva o gosto de ler conhece o prazer ímpar de folhear um bom livro. No seu livro “Como e por que ler?” Harold Bloom escreve que “ler bem ainda é um dos prazeres da solidão, o mais benéfico dos prazeres”.
A última edição da pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”, considerada a mais abrangente para medir o hábito de leitura no país, revelou que nos últimos quatro anos houve uma redução de 6,7 milhões de leitores. É a primeira vez na série histórica da pesquisa que o resultado aponta que a maioria dos brasileiros não leem livros.
O levantamento não abrange somente livros impressos, mas também digitais, e não restringe qualquer gênero, incluindo livros didáticos, bíblia e religiosos. Dados recentes sobre leitura no Brasil revelam que as mulheres continuam liderando entre os leitores, e as crianças ainda são influenciadas pela escola a pegar um livro. Mas à medida que a idade avança, o hábito vai se perdendo, segundo os resultados do levantamento.
Nas regiões, o Sul está na frente, e o Norte registrou a menor queda. São diferenças que refletem desafios além da leitura, como as desigualdades sociais e econômicas e a competição com meios digitais audiovisuais.
Há poucos dias, a revista britânica The Economist publicou matéria na qual mostrava que o romance literário foi a forma de arte dominante no século passado. A revista não afirma que o livro morreu, mas prevê que a leitura de romances se tornará (ainda mais) um nicho, um “hobby digno, como ir a um concerto de música clássica ou balé hoje”.
A diminuição do interesse pela leitura não é fenômeno isolado do Brasil. A Economist mostra que, de 2013 a 2023, os americanos com 15 anos ou mais gastaram apenas 15-16 minutos por dia lendo “por interesse pessoal”. Isso representa 18% a menos do que em 2013-2015, de acordo com o Bureau of Labor Statistics da América. Eles assistem TV por mais de duas horas e meia por dia, em média. No Brasil, o tempo médio em frente à TV é ainda maior: 5 horas e 14 minutos, informa a Kantar Ibope.
Como é hábito no final do ano, a mídia publica as listas dos livros mais lidos no período, e vale como um indicador dos gêneros preferidos pelo brasileiro. O livro que venceu o Prêmio Jabuti de romance literário, “Salvar o fogo”, de Itamar Vieira Junior, não figura entre os mais vendidos.
As listas dos mais procurados têm variações. Algumas contemplam a bíblia; muitas obras da escritora americana Colleen Hoover, com temática romântica de ficção para adultos, exposição de relacionamento tóxicos, traumas e violência.
A escritora e jornalista Carla Madeira está presente nos rankings com seu romance de estreia “Tudo é Rio”. O livro “Ainda estou aqui”, de Marcelo Rubens Paiva, no qual é baseado o filme homônimo e enorme sucesso de bilheteria, com Fernanda Torres, também está nas listas.
Com a estreia da série “Cem anos de solidão” na Netflix, baseada na célebre obra do escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez, Prêmio Nobel de Literatura, o livro entrou recentemente na lista. É um dos romances mais importantes do Século XX, maior exemplo do gênero literário chamado Realismo Mágico.
Linkedin: LinkedIn.com/miriam-moura-025b5176
Leia também de Miriam Moura:
Viajar é criar momentos de vida
Experimentar arte eleva nosso espírito
‘Microalegria’, a tendência que nos conecta ao sentido da vida