
Meus filhos passavam por uma ótima fase da vida. A Camila fazia o que gostava, estava apaixonada. O Luiz tinha sido nomeado diretor do escritório de arquitetura onde trabalhava, na Austrália. Ele e a esposa, Fernanda, estavam radiantes com o bebê que chegaria em breve.
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Naquele 25 de janeiro, eu passeava pelas ruas de São Paulo quando recebi a notícia de que uma barragem havia se rompido em Brumadinho, em Minas Gerais. Meus filhos, o pai deles e a madrasta estavam na região para visitar o museu de Inhotim. Sem entender muito bem o que estava acontecendo, voltei para casa em busca de informações. Depois disso, foi um turbilhão de emoções. Aos poucos, as notícias foram chegando. O corpo do Luiz foi o primeiro a ser encontrado, no dia 29. Acharam a Camila junto do pai, no dia 31. A Fernanda, só 22 dias depois da queda, em 16 de fevereiro. O corpo da madrasta dos meus filhos não foi encontrado até hoje, acredita?

Essa ruptura causou em mim muita indignação no início, muita dor. Então, comecei a perceber que o impacto nas outras pessoas também tinha sido imenso. Logo após a morte deles, fizemos uma missa em São Paulo. Mais de 700 pessoas compareceram. Um mês depois, os amigos da Camila e do Luiz fizeram uma homenagem, e foram quase 300 pessoas. Naquele dia, eles nos propuseram criar uma fundação. O Instituto Camila e Luiz Taliberti é o legado dos meus filhos.
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Hoje eu sei que ter raiva não adianta. Só faz mal para o hospedeiro. Precisamos diferenciar a raiva da dor. A raiva a gente sente e resolve de outro jeito. Eu fiz umas meditações e ainda tenho que enfrentar meus problemas de raiva, de sentimentos ruins. A dor permanece aqui e é enorme. Também doeu em muitas outras pessoas. O lema do instituto é ‘Nos enterraram, mas não sabiam que a gente era semente’. Quero que os valores dos meus filhos ajudem outras pessoas, que sejam revertidos em ações positivas para a defesa do meio ambiente.
O período é difícil para mim. Mas, de alguma forma, eu estou me realizando com esse trabalho. A Camila tinha razão. Não dá pra parar enquanto todo mundo não tiver as mesmas oportunidades que nós. A gente pode fazer pouco, mas tem que falar muita coisa. Estou satisfeita porque vejo o engajamento de muita gente. Eu ganhei filhos e filhas. E netos. A Camila e o Luiz deixaram sementes de amor e justiça.”
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