Ingo Ostrovsky
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A palavra é conhecida, mas pouco usada. Começou a ser publicada com mais frequência depois que um ex-ministro do atual governo brasileiro – o das Relações Exteriores – começou a dizer que ser pária não tinha o menor problema. Ele até “prefere” ser pária do que outra coisa.
Recentemente a palavra voltou a ser usada por todos os veículos de comunicação para relatar as limitações a que os párias são submetidos na ilha de Manhattan, em Nova Iorque, onde são obrigados a comer pizza com as mãos, em pé na calçada de uma rua qualquer.
Os parias são os membros da casta mais baixa da sociedade, na India. É de lá que vem a palavra. A rigor são seres que não pertencem a casta nenhuma, são tão desprezíveis e impuros que não se encaixam em qualquer estamento social. Segundo o dicionário Houaiss, entre os párias se incluem os bastardos, os filhos de meretrizes (conhecidos entre nós como filhos-da-puta) e os que cometeram graves infrações contra preceitos sociais ou religiosos.
Você se reconhece nessas definições?
O Dicionário Analógico da Língua Portuguesa, uma obra monumental de Francisco Ferreira Azevedo (a primeira edição é de 1950) coloca os párias na companhia de gente da pior qualidade: plebe ignara, gentalha, escumalho, a ralé, a escória, a choldra, os infelizes, os miseráveis, as classes inferiores, a última camada social, o vulgo profano… e por aí vai.
Consegue ver o Brasil e os brasileiros nessas categorias?
Não dá, por exemplo, para chamar o brasileiro Pelé de pária. Esta semana ele nos deu uma aula de humildade ao se deixar fotografar no hospital – onde se recuperava de uma cirurgia – com os cabelos grisalhos. Nunca tínhamos visto o Rei de cabelos brancos. Havia até uma crença de que Pelé arrancava os fios embranquecidos da cabeça toda manhã e só se considerava acordado depois de ver no espelho o cabelo totalmente preto.
Em 2008 estive com Pelé na visita que ele fez à Vila Olímpica dos Jogos de Pequim, divulgando a Rio 2016. Depois da visita ele tinha que caminhar uns 300 metros para chegar até seu automóvel. O problema era que nesses 300 metros ele seria reconhecido e provocaria uma aglomeração de admiradores que transformaria um trajeto de 3 minutos num evento de pelo menos meia-hora. “Me deem um boné” disse o Rei. “Eu sou reconhecido pelo meu cabelo, se eu escondê-lo vou caminhar tranquilo até o carro”. Não deu outra. Com um bonezinho enfiado na cabeça ele se misturou à multidão e não foi reconhecido ou importunado.
Antes de ter alta e voltar para casa na quinta-feira Pelé convocou um cabeleireiro ao hospital para cuidar de sua marca registrada. Foi visto sorridente e de cabelo preto ao lado da esposa e dos médicos que o atenderam. Vida longa ao Rei!
Os párias? Deixa eles prá lá!
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