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A queixa das especialistas ouvidas neste artigo é que medicamentos largamente receitados pelos médicos para mulheres, especialmente mais velhas, são testados pelos organismos de pesquisas somente em homens.
“Parte-se do pressuposto que a biologia feminina não importa e que as mulheres antes da menopausa e na pós-menopausa respondem da mesma forma ao medicamento,” reclama uma delas.
O Leqembi, remédio aprovado nos Estados Unidos para o tratamento de Alzheimer, é citado como exemplo claro dessa prática de ignorar o sexo feminino:
“Enquanto 43% dos homens se beneficiavam com o remédio, a taxa de sucesso entre mulheres era de 12%,” diz estudo, lembrando que “dois terços dos pacientes com Alzheimer são mulheres”.
Leia o artigo de Mariza Tavares, do blog Longevidade: Modo de Usar, publicado por O Globo:
Em mais de uma ocasião, escrevi que, historicamente, os ensaios clínicos ignoravam as mulheres, criando medicamentos feitos sob medida apenas para os homens. A situação melhorou, mas não para as mais velhas, que continuam sendo medicadas sem um lastro científico comprovando a eficácia do tratamento. A médica Stephanie Faubion, diretora do Centro para a Saúde da Mulher da Clínica Mayo, contou à repórter Judith Graham, do site KFF Health News, que muitas drogas largamente prescritas para idosos, como estatinas para combater altos níveis de colesterol, foram avaliadas em homens – e seus resultados “extrapolados” para as mulheres.
“Parte-se do pressuposto que a biologia feminina não importa e que as mulheres antes da menopausa e na pós-menopausa respondem da mesma forma ao medicamento. Isso precisa acabar: os testes têm que levar em conta gênero e idade para sabermos como afetam as pacientes”, declarou.
A droga Leqembi foi aprovada pelo FDA (o equivale norte-americano da Anvisa), em 2023, para deter o avanço do Alzheimer depois que o fabricante relatou uma diminuição de 27% do declínio cognitivo. No entanto, um apêndice do estudo sobre o medicamento, publicado no “New England Journal of Medicine”, revelou que havia uma diferença gritante em sua eficácia por gênero: enquanto 43% dos homens se beneficiavam com o remédio, a taxa de sucesso entre mulheres era de 12%. Não se pode esquecer que dois terços dos pacientes com Alzheimer são mulheres!
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Mesmo com um número maior de doenças autoimunes, distúrbios como ansiedade e depressão e limitações para realizar atividades diárias, a resiliência feminina é impressionante: nos EUA, vivem cinco anos a mais que os homens; no Brasil, sete – portanto, se queremos o bem-estar dos idosos, precisamos nos preocupar de verdade com o sexo feminino. A reportagem lista as principais enfermidades que necessitam de uma nova abordagem.
Doença coronariana:
Problemas do coração são mais frequentes após a menopausa e matam mais mulheres que qualquer outra condição. Entretanto, o atendimento a pacientes com dores no peito é muito mais rápido quando se trata de um homem. Martha Gulati, diretora de cardiologia preventiva no Hospital Cedars-Sinai, diz que idosas são mais suscetíveis de ter entupimentos em vasos menores (enquanto os homens são propensos a obstruções coronarianas), que acabam sendo negligenciados.
Saúde do cérebro:
Há diversos fatores que afetam a saúde do cérebro feminino: entre outros, lidar com o sexismo, as atribuições como cuidadora e dificuldades financeiras, principalmente quando a mulher está sozinha na posição de chefe da família.
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Elas também apresentam uma maior incidência de doenças que impactam o cérebro, como esclerose múltipla e derrame. Por último, mas não menos importante: a diminuição da produção do estrogênio, na transição para a pós-menopausa, um hormônio que protege o órgão.
Saúde mental:
Estudos sugerem que a maior vulnerabilidade feminina em relação a quadros de ansiedade e depressão pode estar associada a mudanças hormonais e ao efeito cumulativo do estresse. Paula Rochon, professora de geriatria da Universidade de Toronto, defende a tese de que as mulheres mais velhas sofrem um duplo preconceito, que combina sexismo e etarismo e as torna “invisíveis”, comprometendo sua saúde mental.
Câncer:
Supriya Gupta Mohile, diretora do setor de pesquisa oncológica geriátrica da Universidade de Rochester, propõe que, em vez do fator idade, o estado geral de saúde seja o fator para definir o rastreamento de câncer: “minha avaliação é de que, atualmente, fazemos exames em excesso em idosas frágeis e damos menos atenção do que devíamos a idosas saudáveis”. Ele também demanda pesquisas sobre o câncer de pulmão em mulheres, dada a agressividade dos protocolos: “muitas têm diversas comorbidades e a soma dessas condições mata mais do que o câncer de mama. É preciso saber quem consegue tolerar o tratamento”.