
Márcia Lage
50emais
Que nome dar a uma prática do INSS, que vem descontando dos aposentados, sem o consentimento deles, pequenas parcelas mensais de contribuiçäo destinadas a empresas de prestação de serviços de saúde ou sindicatos, de forma tão velada que, quando o beneficiário se dá conta, já vem sendo lesado há meses, até anos?
Seria Peculato? Crime cometido por servidor público para beneficiar a si próprio ou a terceiros, usando as facilidades do cargo para tal? Corrupção? Tráfico de influência? Seja que nome tenha, o fato vem ocorrendo regularmente no Instituto Nacional de Serviço Social, de acordo com informações dos servidores que trabalham nos postos físicos de atendimento da Instituição.
Segundo eles, mais de 40 entidades fizeram acordo com o INSS para obterem esse tipo de vantagem ilícita. Algumas, criadas às pressas e até com endereços falsos. Estão espalhadas por todo o Brasil e o aposentado de um estado do sudeste, por exemplo, pode estar sendo cobrado por uma empresa da região norte. O que elas oferecem? Beneficios inalcançáveis pela distância ou consultas médicas virtuais. Resumindo: são fraudulentas.
Só descobri o golpe na minha folha de benefício porque, sem aviso prévio, o INSS mudou a data do pagamento. Era todo dia dois e passou a ser no quinto dia útil, o que me obrigou a trocar as datas de vencimento dos cartões de crédito e tudo que eu podia alterar, para não pagar multas por atrasos.
Para fazer essas mudanças entrei no aplicativo Meu INSS, que disponibiliza, a cada mês, a data correta do depósito.
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Ao abrir os dois últimos extratos de pagamento, deparei com a contribuição de 82 reais para uma entidade chamada Master Prev.
Puxei os extratos dos 12 últimos meses de recebimento do benefício e descobri que estava pagando mensalidades á tal empresa desde setembro de 2023.
Liguei para o número 156 do Instituto, mas não havia opção para falar com um atendente.
Pesquisei no Google para ver que empresa era aquela e descobri um endereço em Brasilia.
Abaixo do desconto havia um número começado com 0800 e liguei. Uma moça me atendeu.
Pedi a exclusão do convênio e solicitei o estorno dos valores pagos. Ela tentou me explicar sobre os benefícios que eu ia deixar de ter (quais, se nem um panfleto ou explicação do que ofereciam tiveram a coragem de me enviar?) e disse, com a distorção de que eu estava rompendo um contrato, que se eu desistisse do negócio teria direito à devolução de apenas as duas últimas parcelas.
Resumindo, tinham me tomado quase 500 reais e se dispunham a devolver 164,00. No dia seguinte fui ao INSS solicitar o cancelamento e a devolução total do que havia sido retirado.
Muito gentilmente a atendente disse que era uma praxe instituída em todo o Brasil e que o INSS, apesar de conivente, não se responsabilizava pelo roubo. Só o Procon poderia me ajudar.
E como todo crime gera oportunidade de ganho para muitos, ao sair da agência fui abordada por um caçador de vítimas, que me levou a um escritório de advocacia. Tive medo, parecia uma ação orquestrada. Mas, como não tenho nada a temer nem a perder, fiz uma reclamação junto à Justica de Pequenas Causas, para reaver o que perdi e contribuir para estancar a roubalheira.
Também denunciei a empresa no site do Procom/DF, mas o email voltou, e no site Reclame Aqui, que já tem centenas de denúncias contra a tal Master Prev.
Desesperançada como Josef K, o personagem de Franz Kafka que luta contra um Estado invisível, injusto e repressor, fiz a minha parte.
Cancelei o convênio (já me alertaram que a qualquer momento ele ou outro pude voltar) e aguardo um desfecho justo para o caso. Meu dinheiro de volta e um pedido de desculpas, se possível.
Enquanto isso, faço o alerta aos aposentados. Entrem no aplicativo do INSS e pesquisem seus extratos de pagamento. Além dessas empresas fantasmas cobrando mensalidades, tem muito caso de empréstimos consignados sendo descontados da mesma forma.
É golpe de todo lado. Não dá para confiar em mais ninguém. Nem nas instituições públicas. A corrupção foi institucionalizada.
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