Maya Santana
Fiz esta entrevista com Pedro Bial há dois anos, em março de 2014. Hoje, dia 29, ele completa 58 anos de vida. E decidi postá-la novamente. Aparentemente, o que mudou na vida do apresentador de lá para cá é que ele se casou novamente. Quando perguntei por que ele havia dito que não se casaria de novo, ele respondeu: “Já deixei para alguns o legado de minha miséria, passei os genes adiante. Nunca fui um bom marido, mesmo quando me dediquei a isso. Tá bom assim. Talvez, um dia…”
Leia:
Conheci Pedro Bial em Londres, no final da década de 1980. Eu trabalhava na BBC e ele era correspondente da TV Globo. Pedro tinha, então, algo em torno de 30 anos, era bem magrinho, mas o mesmo homem bonito de hoje. Fora deslocado para a Europa em um momento especialmente delicado da História e terminou por testemunhar os maiores acontecimentos políticos daquele tumultuado final do século XX, entre eles, a queda do muro de Berlim, em novembro de 1989 e, em seguida, o desaparecimento da então União Soviética.
No meio daquela agitação toda e de muito trabalho, vez por outra, eu me encontrava com ele na casa onde morava com a mulher, Renée Castelo Branco, e os filhos Ana, Marina e João, no movimentado bairro de Camden Town. As lembranças que guardo daquele tempo são as melhores : Pedro fazendo churrasco, brincalhão, sempre atento e gentil com Renée e os filhos que, quando o trabalho lhe dava tempo, carregava de um lado para outro em um enorme carro da marca Volvo.
De tudo, o que mais me encantava em Pedro era a capacidade que ele tinha, mesmo quando não contribuía em nada para isso, de fazer com que as mulheres, de todas as idades, nacionalidades e crenças, se apaixonassem por ele. Há poucas semanas, quando me encontrei com ele numa festa, perguntei se poderia mandar algumas perguntas, “todas de caráter existencial”, expliquei. “Claro, vou me divertir muito respondendo”, disse ele. O que eu tinha em mente ao elaborar as perguntas é saber como um homem tão bonito, casado várias vezes, sempre tão cortejado como este, está envelhecendo. Sozinho. Ele completou 57 anos no dia 29 de março.
– Você é daqueles que pensam muito no próprio envelhecimento?
Não que eu pense muito sobre a minha idade em particular, mas como nosso ofício nos leva a desenvolver o hábito da observação, e possível subsequente análise, muita coisa do que vejo, escuto, consumo, aprecio e desprezo no meu cotidiano me remete ao tempo. Aos novos tempos, que sempre nos levam aos nossos particulares tempos passados. A música que se escuta no rádio abre um “pop up” para outra música, a notícia no jornal, a moda, a palavra, o vocabulário da hora – as novidades em geral ativam a memória.
Vivemos tempos tão espantosos, presenciamos uma revolução tão profunda, a revolução da informática, tudo é tão irreconhecível, que é difícil não perceber que você se tornou uma figura “de época”. O que só torna tudo mais divertido.
Tentando ser claro: como tudo anda tão diferente, não há como não perceber que nós mesmos estamos diferentes. A velhice é uma baita diferença.
Daí penso, e principalmente tento fazer ginástica. Fui atleta quando jovem, e trago sequelas de meu arrojo adolescente e da medicina esportiva da época. Tornozelos, joelhos, quadris, coluna, ombros, artroses, um compêndio de afecções ortopédicas. O “hardware”doloroso é o maior impulso rumo à esteira e aos pesos. É um saco fazer, mas para ter mínimos bem estar e qualidade de vida, puxo os ferros toda manhã.
– Tem alguém que você admira pela postura diante do envelhecimento? Você gostaria de envelhecer como quem?
É tão pessoal isso, né? Sim, admiro, por exemplo, o velho em que David Bowie se tornou. Mas sempre o admirei também por sua postura diante da juventude… E Bowie não vale, ele não é daqui! Minha mãe tem garra, vai fazer 90.
Constanza Pascolato deu uma entrevista linda, creio que semana passada, acho que ao Estadão, em que me identifiquei com um certo fatalismo diante do inevitável. Parece que, depois de uma certa idade, vai-se negociando com o tempo, e o tempo é um negociador inflexível. Então, vamos fazendo as coisas que gostamos de fazer, até não podermos mais fazê-las. E nossa rotina torna-se uma administração procastinatória constante, dosando tudo o tempo todo, aqui e ali, de um raio de sol a uma dose de tequila.
– Daqui a três anos, você chegará aos 60. Será oficialmente, portanto, um idoso. Sendo um homem tão bonito como é, como você sente a chegada da idade?
Segundo os meus cálculos e a OMS, como vivo na metrópole do Rio de Janeiro, pertenço a um estrato que só chegará tecnicamente à velhice aos 65 anos. (eu deveria botar “rsrsrsrs” depois dessa frase, mas somos de época…)
Obrigado pelo elogio! Do alto de minha modéstia, acho que estou mais bonito agora.
Procuro me alimentar com consciência. Consciente que estou fazendo merda… O maior problema é que, com os anos, a gente aprecia muito mais e melhor o sabor de tudo, e qualquer nada engorda.
– Com o os horários difíceis em que trabalha, você consegue se alimentar corretamente?
Nem sempre, nem sempre… Você tá parecendo meu médico, eu hein…
– O que você faz para se manter em forma? É esbelto, controla o que come?
Tenho minha lamentável barriga, pelejo contra ela. Como disse, malho à vera, todos os dias. Negocio minhas refeições da seguinte forma: já que é hora de comer, tento comer bem. Não necessariamente muito, ao contrário. O prazer pode ser bom conselheiro.
– Seus amigos acham você um excelente cozinheiro. Na cozinha, o que mais dá prazer?
Concentrar-se no que minhas mãos estão fazendo, os cheiros, gostos, texturas e temperaturas. A taça de vinho e, cereja do bolo, a companhia para quem você está cozinhando.
– Você foi jogador de basquete, repórter, repórter especial, correspondente no exterior, apresentador de programa de literatura, do Fantástico, do Big Brother, do Na Moral, diretor de cinema, escritor … O que você gostaria de fazer que ainda não fez?
O que está para ser feito, em variações a partir dessas atividades, sempre algo gestado em texto.
– Você namorou muito (…e ainda namora…), foi casado várias vezes. O que você aprendeu com as mulheres?
Além de ter medo delas, acima de tudo a versatilidade, a simultaneidade. Mas homem não consegue, persegue.
– Recentemente, você disse numa entrevista que não se casaria de novo. Por quê?
Já deixei para alguns o legado de minha miséria, passei os genes adiante. Nunca fui um bom marido, mesmo quando me dediquei a isso. Tá bom assim. Talvez, um dia…
– Do que você sente saudades? E do que não sente saudades?
Da visão incrível que tinha, do vigor, da saúde de ferro. Tenho saudades de tudo, mas não sofro de saudade.