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Márcia Lage
50emais
Os velhos mais alegres do Brasil devem ser os que frequentam Conservatória. Embora pouco divulgado nos sites de turismo, esse distrito de Valença (RJ), incrustado entre montanhas da Mantiqueira e o vale do Paraiba, é tão ou mais seresteiro que Diamantina, sua irmã mineira na musicalidade.
Todo fim de semana, a pequena cidade se enche de jovens anciãos que vão lá para cantar. Os músicos locais atiçam a garganta do povo com uma apresentação conjunta na sexta-feira à noite, na pracinha rodeada de bares. Todos acompanham as apresentações que se sucedem, num repertório que continua eterno na memória coletiva do brasileiro.
São músicas de compositores ou intérpretes como Vicente Celestino, Chiquinha Gonzaga, Dalva de Oliveira, Nelson Gonçalves, Pixinguinha, Caubi Peixoto, entre outros. Quem já passou dos 50 anos as conhecem de ouvido, de escutar suas execuções no rádio ou na boca de seus pais ou avós.
Menores de idade (no caso, menos de 50) se dão conta de que algumas dessas músicas foram regravadas mais recentemente por Marisa Monte, Roberto Carlos, Paula Toller e até Cazuza. E se surpreendem ao saber cantá-las também.
A apoteose da cantoria coletiva se dá aos sábados. Os seresteiros locais, acompanhados de violões, violas, cavaquinhos e pandeiros, abrem a procissão dos turistas pelas ruas de casas históricas, cujas construções, em estilo colonial/mourisca, têm letras de músicas nas fachadas.
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Em agosto, acontece o festival dos seresteiros, com microfone aberto para quem quiser participar. É surpreendente o número de candidatos, cada um melhor que o outro em voz e interpretação. Se não cair garoa sobre as cabeças brancas encapuzadas, o público é capaz de ver o sol nascer, sem arredar pé do palco, montado ao lado da antiga estação de trem.
Uma das versões para explicar a paixão do lugar pela serenata diz que foi iniciada por um maquinista mineiro, há cerca de 140 anos.
Enquanto aguardava o carregamento da produção de café do Vale do Paraiba e do sul de Minas para levá-la aos portos do Rio de Janeiro – o que podia durar até três dias -, ele espantava o tédio tocando violão e cantando.
A serenata virou atração e se profissionalizou com o trabalho do violinista e professor Andreas Schimidt, que morava no distrito.
Mais tarde, os irmãos Joubert e José Borges de Freitas Neto criaram o Museu da Seresta, que organiza as apresentações e não deixa a tradição acabar.
Muita gente famosa subiu a Serra das Araras para se juntar aos seresteiros locais. Os registro dessas visitas estão no Museu da Seresta e no Museu Vicente Celestino, criado por um filho adotivo do cantor.
Lá, os turistas verão algumas roupas, discos e recortes de jornais e revistas sobre os memoráveis shows que os cantores e as cantoras do rádio fizeram por esse país afora, num tempo sem TV e sem internet.
Crianças e jovens do distrito são preparados para substituir os velhos seresteiros no futuro, com aulas de instrumento e canto no Centro Cultural Juliana Maia.
Juliana é uma artista local de voz poderosa. Ela se apresenta no teatro de bolso que leva seu nome, em dias e horários não conflitantes com as serestas.
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Vale a pena conhecer essa mulher. Seu charmoso teatrinho oferece serviço de bar com bebidas e salgadinhos.
Num ambiente romântico e descontraído, os turistas aplaudem de pé suas interpretações dramáticas de cantoras como Maria Betânia, Elis Regina, Cassia Eller.
É de derreter corações empedrados, descrentes da alegria de viver.