
Miriam Moura
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Neste ano meu carnaval foi em João Pessoa, uma viagem tipo refúgio para praia e experiência cultural. Eu havia recebido as melhores referências sobre a simpática capital da Paraíba, cidade onde havia passado somente dois dias a trabalho antes da pandemia. Minha estadia neste feriado foi a mais agradável possível. “Jampa”, como é carinhosamente chamada pelos seus habitantes, recebe visitantes de coração e alma abertos, uma lindeza.
A cidade foi eleita um dos destinos globais mais procurados em 2025, segundo pesquisa do Booking.com sobre as previsões de viagem para o ano. Conhecida como “Porta do sol”, Jampa é o ponto mais oriental do continente e possui inúmeras belezas naturais.
Mas a surpresa mais agradável foi a hospitalidade dos habitantes no convívio com visitantes. Em tempos em que cresce o movimento para acabar com o turismo em muitas capitais europeias, Jampa acolhe a todos com um largo sorriso, uma gastronomia diferenciada e beleza natural por todos os lados.
Segundo o mestre Houaiss, hospitaleiro é aquele que acolhe francamente, que agasalha. O sentido de hospitalidade é recepção ou tratamento afável cortês; amabilidade.
De acordo com a Revfine, plataforma de conhecimento para a indústria hoteleira e viagens, hospitalidade é recepção de visitantes, convidados ou estranhos. Também se refere à prestação de serviços de hospedagem, chamada de hospitalidade funcional.
Essa última acepção da plataforma “descreve uma relação positiva entre o anfitrião, agindo com boa vontade, e o hóspede, que mais comumente busca comida, abrigo, segurança e/ou entretenimento”. Uma boa maneira de pensar no objetivo de hospitalidade é oferecer “uma casa longe de casa”, para as pessoas se divertirem, sugere.

“O livro da hospitalidade”, coordenado por Alan Montandon, é considerado uma obra de referência sobre o conceito de hospitalidade através da história, da cultura e do imaginário. A obra tem mais de70 colaboradores entre professores de literatura comparada e de sociologia, de universidades francesas e estrangeiras. É uma leitura providencial nos tempos atuais, quando imigrantes estão sendo deportados de países escolhidos como destino.
Em 2023, uma das tendências para o turismo era a de “viagem significativa”, na qual o visitante mergulha no destino de maneira respeitosa, segundo publicou a newsletter Roadbook, focada em guias de viagens e fotografia. Mas o que testemunhei no ano passado em viagens para algumas cidades europeias foi uma aversão generalizada a turistas, de qualquer nacionalidade. “Tourists, go home” é um movimento que vem escalando nos últimos meses na Europa.
Essa é também a razão que me fez escrever sobre a experiência da acolhida amigável em João Pessoa. Em pleno domingo de carnaval, fiz um passeio cultural pelo centro da cidade e achei que talvez fosse uma das raras visitantes a escolher o programa histórico.
Foi outra grata surpresa: havia grupos de turistas também interessados em ouvir o guia do Centro Cultural São Francisco, na antiga Igreja construida pelos franciscanos em 1.587, quando os religiosos chegaram em João Pessoa, a terceira cidade mais antiga do país. O prédio é deslumbrante e é um dos monumentos mais importantes do estilo barroco na América Latina.
A visita a João Pessoa também foi um motivo para relembrar o importante Movimento Armorial, idealizado por Ariano Suassuna, para criar uma arte brasileira singular, valorizando as artes populares nordestinas. A capital paraibana respira isso, esse resgate de nossas raízes na gastronomia e na arte popular.
Em 4 de setembro de 2000, Suassuna escreveu um texto na Folha de S.Paulo sobre o Movimento Regionalista e o Armorial, no qual pontuou as diferenças entre ambos. A principal distinção, ensina, é que o regionalismo é uma especie de neo-naturalismo.

“No meu teatro, por influência de Gil Vicente, do teatro do Século de Ouro espanhol, do Barroco e do Romanceiro Popular Brasileiro, havia um elemento mágico e poético que me afastava dos regionalistas”, escreveu Suassuna, referindo-se ao seu “Auto da Compadecida”, peça teatral em forma de auto, escrita em 1955.
Suassuna discordou da afirmação do escritor regionalista José Lins do Rego, para o qual o Regionalismo, “no plano artístico, é uma sondagem na alma do povo, nas fontes do folclore”. Suassuna diz que prefere não ser chamado de regionalista, pois na sua opinião essa descrição fica nas aparências do social, fazendo jus a todas as acusações de “pitoresco”.
“Faço da originalidade um conceito bem diferente do de hoje, procurando criar um estilo capaz de acolher o maior número possível de histórias, mitos, personagens e acontecimentos, para atingir, assim, através do que consigo entrever em minha região, o espírito tradicional e universal”.
Ariano Suassuna procurou fazer “um teatro que tenha coragem de juntar personagens diferentes, investindo contra um falso entendimento da unidade de estilo. Na vida também há diversidade: personagens de tragédia e de farsa misturados numa só história”.
Em João Pessoa, estão à nossa espera muita história, gastronomia de raiz, natureza e a imensa riqueza da diversidade brasileira. Como antecipou o escritor russo Leon Tolstoi: “Cante a sua aldeia e você será universal”.
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