Maya Santana, 50emais
Quando a gente observa a maneira como o Brasil está envelhecendo, fica assustada. O país ainda pode ser apontado como relativamente jovem. Mas vai perder essa condição em 2031, quando terá mais idosos – pessoas com mais de 60 anos – do que jovens e crianças. Para se ter um ideia de como estamos envelhecendo rapidamente, em cerca de 10% das cidades brasileiras, a parcela da população com idade superior a 60 anos já é maior do que menores de 15 anos. Diante desse quadro, cada trabalhador brasileiro precisaria produzir mais que a média atual para o país seguir elevando o PIB per capita. Mas há poucas chances disso realmente vai acontecer.
Leia o artigo de Daiane Costa e Elisa Martins para O Globo:
O Brasil envelhece cada vez mais rapidamente. Em pouco mais de uma década, segundo as previsões mais recentes, o país terá mais idosos que crianças e adolescentes. Essa inversão na pirâmide etária acende um alerta para o risco de estagnação da economia e torna mais urgente uma reforma do sistema previdenciário com a perspectiva de mais pensionistas e menos jovens no mercado de trabalho. Empresas terão que se adaptar a profissionais mais velhos, que trabalharão por mais tempo, e oferecer produtos e serviços mais adequados a esse público. Governos terão que reformular políticas públicas. Esse futuro, no entanto, já chegou em quase 10% das cidades brasileiras.
Um levantamento do demógrafo José Eustáquio Alves, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence) do IBGE, feito a pedido do GLOBO revela que, em 531 dos 5.570 municípios brasileiros, o número de pessoas com 60 anos ou mais já supera o de menores de 15 anos. A maioria está nas regiões Sul e Sudeste. Niterói (RJ), Santos (SP) e São Caetano do Sul (SP) são as três cidades mais populosas que já permitem antecipar a realidade nacional prevista para 2031. Juntas, elas abrigam 224 mil idosos, bem mais que suas 178,5 mil crianças e adolescentes.
Além de o número de idosos superar o de crianças e adolescente em 2031, a população em idade para o trabalho (15 a 64 anos) vai começar a encolher em 2038. Segundo projeção divulgada recentemente pelo IBGE, 2018 será o primeiro ano em que essa mão de obra potencial crescerá num ritmo menor que o do total da população no Brasil. É o que os especialistas chamam de fim do bônus demográfico, o que limita as chances de o Brasil se tornar um país rico, como fizeram as nações desenvolvidas antes de envelhecerem. Isso porque haverá literalmente menos gente para produzir os bens e serviços que constituem o Produto Interno Bruto (PIB).
— Não há país que enriqueceu depois de envelhecer porque a força de trabalho encolhe —
Uma forma de compensação seria aumentar a produtividade desse grupo mais enxuto. Ou seja: cada trabalhador brasileiro precisará produzir mais que a média atual para o país seguir elevando o PIB per capita. O problema, aponta o sociólogo especialista em políticas sociais Luis Henrique da Silva de Paiva, é que o crescimento da produtividade do trabalhador brasileiro tem sido historicamente muito baixo.
Solução na Previdência
Segundo levantamento da Fundação Getulio Vargas, numa lista de 68 países, o empregado brasileiro é o 19° menos produtivo do mundo.
— Nas décadas de 1970 e 1980, quando já sabíamos que íamos envelhecer, o Brasil deveria ter investido em educação e em treinamento para garantir o crescimento via aumento de produtividade no futuro. Mas perdemos essa janela — diz o especialista em demografia Gustavo Naves Givisiez, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Nas contas do ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Sergei Soares, quando a proporção de pessoas em idade ativa começar a cair, o Brasil poderá passar a crescer, em média, apenas 0,8% ao ano.
— Vamos virar um Japão, só que de renda média e desigual — diz, em referência à economia do país asiático, terceira maior economia mundial, que estagnou depois de envelhecer.
Outra consequência do envelhecimento acelerado da população é a redução do número de pessoas contribuindo para a Previdência com mais gente na outra ponta recebendo. Estimativas do coordenador de Seguridade Social do Ipea, Rogério Nagamine, mostram que, sem uma reforma que desestimule aposentadorias precoces, o percentual de brasileiros que recebem benefícios, incluindo pensão por morte ou de prestação continuada (destinada a idosos e deficientes) vai dobrar até 2060, passando de 15,2% em 2017 para 32% da população. Para o pesquisador, uma reforma poderia manter brasileiros por mais tempo no mercado de trabalho, diluindo o peso do envelhecimento sobre o crescimento econômico e garantindo a sustentabilidade do sistema previdenciário.
— É fundamental uma reforma que ao menos corrija as distorções do nosso sistema ineficiente, injusto e que se torna insustentável ao permitir aposentadorias precoces para pessoas com plena capacidade laboral — argumenta Nagamine.
Para Eustáquio, da Ence, ainda há chance de o país se beneficiar da demografia. Apesar de a janela de oportunidades ter começado a se fechar, ele avalia que a estrutura etária da população ainda continuará favorável ao crescimento econômico ao menos até 2030, último ano em que teremos mais crianças de 0 a 14 anos que idosos. No entanto, ele pondera que os efeitos da recente recessão podem prejudicar esse aproveitamento:
— As taxas de desemprego e subemprego, além de uma educação de má qualidade, não garantem a exploração plena desse bônus.
O envelhecimento ocorre quando as mulheres passam a ter menos filhos e é um processo novo no mundo. O primeiro país a envelhecer foi a Suécia, em 1975. Segundo Eustáquio, em 2015 já somavam 52.
— A relação entre o que acontece com os países é diferente do que vai acontecer, caso a caso, com os municípios. Mas um impacto é comum: unidades territoriais envelhecidas tendem a ter economias menos diversificada, competitivas e sustentáveis — explica Paiva.
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