Ingo Ostrovsky
50emais
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“No creo en brujas; pero que las hay, las hay”. Esta é uma frase antiga e conhecida na língua espanhola e quer dizer “eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem”.
Você pode estar se perguntando que mágica me fez escolher as bruxas como tema da crônica de hoje. Pois eu te digo: foi uma notícia pouco repercutida numa semana em que duas mortes aqui no Rio de Janeiro – a do imigrante do Congo espancado e a do vizinho negro assassinado a tiros confundido com um ladrão – dominaram, com acerto, as atenções de jornais e telejornais. No meio de tanta consternação, quem é que iria se interessar pelas bruxas?
Euzinho aqui me peguei lendo com atenção a informação de que o Parlamento regional da Catalunha, em Barcelona, concedeu “perdão e reparação” a pela menos 700 mulheres queimadas nas fogueiras da Inquisição entre os séculos 15 e 18. As deputadas catalãs acreditam que foram mais de 1000 as mulheres mortas dessa maneira, numa série de episódios que ficaram conhecidos como “caça às bruxas”.
Caça às bruxas virou dito popular. Hoje em dia quando algo dá errado, seja na política ou no futebol, promove-se uma perseguição aos “culpados de sempre” e ninguém morre por isso, no máximo perde o cargo ou o emprego. Só que lá naqueles séculos não era bem assim. Sem julgamento, sem direito de defesa, sem mais nem menos, as “bruxas” iam pra fogueira.. Quase todas, mulheres.
É mais um gol das feministas. Mais uma prova que mulher não apanha apenas nas páginas de polícia. O feminicídio existe há séculos e as deputadas de Barcelona querem que ele não seja esquecido. Para isso, estão pedido às prefeituras das cidades da província que deem a algumas ruas os nomes das mulheres queimadas pelo único motivo de serem mulheres, indefesas e acusadas de malfeitos que muitas vezes eram da própria natureza, como enchentes provocadas por fortes chuvas. Qualquer coisa de ruim que acontecia, as suspeitas recaiam sobre as mulheres. Se estivéssemos naqueles anos o deputado Eduardo Bolsonaro tinha passado fogo nas “bruxas”, responsáveis, na visão dele, pela cratera da Marginal do Tietê, em São Paulo.
Para mim, como para o senhor ou a senhora, as bruxas são mulheres entradas em anos, de cara amassada, nariz comprido, vestidas de preto e que vivem mexendo em grandes panelas ao fogo. Essa é a imagem que recebemos na infância, é assim que elas são retratadas quando ocupam o lugar do lobo mau nas fábulas infantis. Elas não andam, tem o poder de voar sobre vassouras, principalmente à noite, muitas vezes acompanhadas de um gato preto. São na maioria das vezes mulheres más, é difícil encontrar nas histórias da carochinha uma “bruxa boa”.
As deputadas catalãs vão na contramão dessa noção. Uma delas, citada pelo jornal O Globo diz que “torturadas, perseguidas e assassinadas, essas mulheres tinham um nome e uma vida” que agora, com a nova legislação, poderá ser resgatada. As bruxas boas existem, encantam e são encantadas.
O feitiço está virando contra o feiticeiro!
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