Ingo Ostrovsky
50emais
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Esta semana uma professora de um conhecido curso de formação de pós graduandos em economia pediu demissão por discordar da adoção da chamada linguagem neutra pela universidade onde ela trabalhava. “Bem vindes calouros” foi a mensagem fatal! Teve gente que achou a universidade analfabeta por não usar a palavra “caloures” na mensagem, que tinha ainda uma menção aos alunos do primeiro semestre quando deveria, para ser coerente, usar “alunes”.
A demissionária nem chegou tão longe; ela parou no bem vindes!
O meu corretor de linguagem não aceita nada disso, toda vez que eu “neutralizo” um pronome o corretor vai lá e acerta o gênero. É misógino meu corretor? Ou será misógine?
Onde vamos parar? O que vai acontecer com a nossa literatura? Teremos que reescrever os romances na hora de reeditá-los? O que será de Luís de Camões, de Machado de Assis ou mesmo de Rachel de Queiroz, nossa primeira acadêmica? Vai tudo por água abaixo. Veja bem, aquela discussão sobre Monteiro Lobato ser racista por causa da cor da Tia Nastácia é pinto (pinte?) perto do que esse papo de linguagem de gênero vai causar nos nosso escritos mais sagrados (sagrades?).
Não pude deixar de reparar que a discussão aconteceu na semana em que se comemorou o 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Fui instruído pelas minhas feministas prediletas a não dar flores de presente nesse dia, já nem sei direito por quê. Pois comprei orquídeas e elas foram bem recebidas (recebides?) pelas mulheres a quem agraciei. E tem mais: fui ao florista, nem entrei na loja do floriste, passei longe.
Você, cara leitora, deve estar se perguntando o que esse mísero cronista (croniste?) tem a ver com isso já que nasceu homem e assim permanece mais de 70 anos depois? Pois eu respondo da maneira mais simples possível: não consigo me acostumar. Se acaso você chegasse no meu chateau e encontrasse aquela mulher – mulher, viu! – que te abandonou… Vou cantar isso por todo o sempre e nunca trocarei nossa velha amizade por nada neste mundo. E canto mais: de dia me lava a roupa e de noite me beija a boca… Vai ter que mudar a letra do samba?
A TV me (nos) mostrou dia desses o imenso amor entre Elza e Mané, a atração carnal entre nossa maior cantora e nossa maior alegria, a grande voz e o grande driblador. A multidão aplaudia os sambas de Elza e delirava com os gols de Mané. Que história! Tente neutralizar isso, tente reduzir aquele imenso (imense?) tesão entre samba e bola a um pronome inventado numa prancheta onde não cabe qualquer sentimento.
Fala sério, gente! Igualdade de gênero, sim. Mas vamos proteger a língua mátria!
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