Um texto muito bom de se ler. Primeiro porque fala com espontaneidade das mudanças que ela própria vem sofrendo nessa quarentena, que ninguém sabe quando vai terminar. Se é que vai mesmo chegar ao fim. Suzana Alves , precocemente grisalha, notou as primeiras mudanças na cabeleira quando tinha só 30 anos. Herança da mãe, que também teve os fios embranquecidos bem cedo, como ela conta nesse depoimento ao Uol. “Comecei pintando de dois em dois meses, sempre indo ao salão de beleza. Então fui encurtando o espaço de tempo: agora, aos 41 anos, costumava retocar a raiz de 15 em 15 dias. Tinha também um spray com cor para disfarçar caso eles me incomodassem,” conta.
Leia como ela mudou de ideia e parou de pintar os cabelos:
Durante a quarentena, percebi o quanto o processo natural de envelhecimento de uma mulher se transforma rapidamente em um assunto de interesse público: estava em casa fazendo algo que eu amo, que é cozinhar, quando postei uma foto com a roupa toda cheia de farinha nas redes sociais. Estava sem maquiagem e nem tinha reparado no meu cabelo. Mas foi questão de tempo até virar notícia em diferentes portais por causa dos grisalhos.
Talvez, para boa parte das mulheres, assumir os cabelos brancos seja o início de um processo transformador na vida. Na minha trajetória, no entanto, deixar de pintar o cabelo foi como completar um ciclo. Sou uma pessoa “natureba” e fã de óleos essenciais: uso desodorante, protetor solar e maquiagens naturais. Minha alimentação é orgânica, não como carne vermelha e nem frango. Estou fazendo uma graduação à distância em naturopatia. A tinta era a última química que faltava para me libertar.
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Não quer dizer que abrir mão dela foi fácil. Minha mãe começou a ter cabelos grisalhos bem cedo. Os meus surgiram um pouco mais tarde, por volta dos 30 anos. Comecei pintando de dois em dois meses, sempre indo ao salão de beleza. Então fui encurtando o espaço de tempo: agora, aos 41 anos, costumava retocar a raiz de 15 em 15 dias. Tinha também um spray com cor para disfarçar caso eles me incomodassem.
Foi a ele que recorri quando a quarentena chegou. Sempre que precisava aparecer nas redes sociais, passava o spray na raiz. Depois de um período insatisfeita, pesquisei alternativas e cheguei à henna. Comprei e tentei passar em casa, mas durou pouquíssimo tempo, além de a versão escolhida por mim não ser uma opção 100% natural. Desisti e me acostumei com a presença dos brancos pouco a pouco —até que finalmente comecei a achá-los bonitos.
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Ao observar meu reflexo no espelho, percebi que, conforme os grisalhos cresciam, meu cabelo ficava mais forte e cheio. Já tinha até procurado tratamentos naturais e feito exames de sangue para saber por que tinha os fios com a textura tão rala. Não tinha caído a ficha de que a tinta poderia ser responsável por isso.
Quando percebi aquele tom brilhante, decidi abrir mão da manutenção. E me dei conta do quanto ela pode nos escravizar. É claro que estou triste: sou um ser humano, sinto as dores do outro, jamais poderia me sentir plena enquanto o mundo trava uma guerra contra um vírus. Mas, dentro da minha cúpula, com meu marido e meus dois filhos, estamos nos reinventando e amadurecendo. Essa liberdade está abrindo meus olhos para milhões de coisas, na parte emocional, psicológica e até intelectual.
Cresci em um ambiente de exposição: dançava balé, me apresentava nos palcos, fazia teatro infantil e propagandas para a televisão. Amadureci em meio a essas limitações: não podia ter a perna grossa para dançar e nem para desfilar. Então, aos 18 anos, fiquei conhecida pela personagem Tiazinha. Passei a me encaixar em outro biotipo, mais parecido com o meu: o da mulher brasileira. Fiz sucesso com aquela estética. Mesmo assim, me sentia escrava dela e por isso não era feliz.
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Aos 21 anos, no auge da personagem, eu decidi me aposentar. Precisava me conhecer — na verdade, estava querendo “ir pra dentro”. Estudei teatro, queria focar em outro tipo de carreira. Ainda assim, o sucesso da Tiazinha reverberou por muito tempo.
Quando estava com 24 anos, descobri que meu pai tinha um câncer no estômago. O médico deu seis meses de vida para ele. Então eu, que já tinha hábitos saudáveis, decidi trazê-lo para dentro de casa. Até na minha cama ele dormia. Mudei toda a nossa rotina. Passei a estudar mais sobre a importância de ter uma alimentação boa, tirei o açúcar branco da nossa dieta e fiz um processo de desintoxicação mais radical. Como resultado, ele viveu por mais dois anos.
Após a morte do meu pai, mergulhei ainda mais no objetivo de ter uma vida simples. Trabalhei o lado espiritual, comecei a viver uma vida com propósito. Cultivei a minha própria horta. Dali em diante, tudo ganhou outro significado e fui aprimorando meus hábitos. Sou atriz, tenho uma empresa pequena de alimentos saudáveis, cozinho e acredito na cura através da comida.
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Não sei se as pessoas vão continuar dizendo que tenho “carinha de menina” agora. Mas a verdade é que me sinto jovem por fora e por dentro. A gente só envelhece mal quando não se conhece e quer manter o mito do intocável. Algumas pessoas se decepcionaram ao ver minha foto porque não querem romper com o mito do ícone pop —que é, na verdade, uma questão interna, um arquétipo que fazem questão de manter. Os comentários negativos dizem muito mais sobre seus autores do que sobre mim.
Por sorte, quase todos os comentários foram positivos. Fico feliz: não pela aprovação, mas por perceber que as pessoas estão bem consigo mesmas. Não sei o dia de amanhã e tenho o coração aberto. Se uma emissora me chamar para interpretar uma personagem mais jovem, por exemplo, posso pensar em mudar novamente. Mas a verdade é que a pandemia me ajudou a focar muito mais no presente. Para mim, envelhecer querendo ser como era há 20 anos é triste e escraviza. Por enquanto, me sinto forte e bonita assim.
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