Eu sou privilegiada. Tenho nove irmãos com quem me dou muito bem. O mais jovem tem 59 anos e o mais velho 76. Fico mais ou menos no meio, com 70.Alguns deles moram na velha casa dos nossos pais, perto de Belo Horizonte. É lá que me vejo, quando me imagino velhinha, já sem muita autonomia. Digo que me considero privilegiada porque sei que a maioria das pessoas não tem esse conforto de saber onde estará na velhice. Neste artigo, da Dra. Juliana Duarte, geriatra especialista em cuidados paliativos, dá uma visão geral das opções de moradia que uma pessoa tem quando envelhece, além, claro, de permanecer em sua própria casa.
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Quando pensamos em opções de moradia para os mais velhos, nos vem à cabeça duas opções apenas: continuar morando em sua própria casa ou ir morar em um asilo ou casa de repouso. A palavra asilo traz em sua gênese a ideia de isolamento e solidão e, por esse e outros motivos, evitamos o nome. Atualmente usamos o termo ILPI (instituição de longa permanência para idosos) para nos referirmos a essa opção de moradia já bem conhecida por todos.
Assim como a longevidade e todas as suas facetas são novidade em nosso país, cada vez mais vêm surgindo formas diferentes de morar em idades avançadas, e isso é muito bom por vários motivos. A fase de vida que começa aos 60 anos, se tudo der certo, será bem longa. Cada vez mais as pessoas chegam a essa idade e irão viver outros 30 a 40 anos. Além disso devemos evitar pensamentos estigmatizados sobre a velhice, é errado acreditar que todo mundo faz 60 anos e, como uma passe de mágica, começa a se identificar com as mesmas coisas e a querer morar do mesmo jeito.
Para esse contingente crescente de pessoas únicas, nada como um grande leque de opções de moradia. Pesquisas vem mostrando que no Brasil a maioria das pessoas prefere envelhecer e continuar vivendo em sua casa e com sua família. Existe um movimento crescente nesse sentido denominado “aging in place” (envelhecendo em casa).
Para continuarmos vivendo em nossa casa, principalmente diante de uma condição de maior fragilidade física ou diante da indisponibilidade de pessoas ou recursos financeiros suficientes, são necessários muito planejamento pessoal e, para muita gente, apoio governamental. Além do mais, precisamos lembrar que é muito importante a socialização, e as pessoas que envelhecem em casa, em nosso país, frequentemente sofrem com a solidão. Escreverei sobre o movimento “aging in place” em outro momento.
Para as pessoas que pensam em envelhecer juntamente com outras, existem várias opções de moradia compartilhada (cohousing, república, coliving), de moradia assistida e de instituições de longa permanência para idosos tradicionais. O que diferencia essas moradias entre si, é o propósito de cada uma e o grau de assistência necessário a seus moradores. Vou citar aqui algumas delas:
República e Coliving: Esses modelos de moradia vem ganhando cada vez mais adeptos e já existem estruturas desse tipo em Minas. Neles se reúnem pessoas que são independentes e autônomas e compartilham o lar com o intuito de viver de forma mais sustentável, econômica e socialmente mais rica, dividindo espaços e experiências. As repúblicas e colivings costumam aproveitar espaços urbanos, que são então preparados para abrigar diversas pessoas. Os moradores se ajudam e dividem as tarefas. Existe uma startup atuando em São Paulo cujo propósito é aproximar pessoas que pretendem viver de forma compartilhada. Essa empresa planeja expandir sua atuação a Belo Horizonte.
Cohousing: São estruturas maiores e construídas com o objetivo de serem uma moradia compartilhada. Um exemplo inspirador de cohousing é a Vila ConViver, um projeto de um grupo de professores da Unicamp que optaram por estender a convivência que construíram ao longo da vida profissional.
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Moradias Assistidas: As moradias assistidas abrigam pessoas que precisam de um grau pequeno ou intermediário de apoio. O objetivo de uma moradia assistida é apoiar no que é necessário e incentivar a autonomia dos seus moradores. Eles oferecem assistência mais individualizada e na medida da necessidade de cada um, partindo da demanda da própria pessoa idosa. A assistência costuma ser menos padronizada e em horários mais livres do que nas ILPIs convencionais. Em Belo Horizonte já existe moradia assistida com estrutura verticalizada, nos moldes de um hotel, e em estruturas de casa e, em breve, haverá outras.
Outro modelo que está chegando em Minas são as moradias assistidas em formato de vila, com espaços comuns.
Moradias Assistidas especializadas: Esse modelo se dedica a abrigar pessoas com
situações e necessidades específicas. Na Holanda, por exemplo, existe uma vila inteiramente dedicada a pessoas portadoras de demência. O Centro Hogeweyk, em Weesp, foi construído com o objetivo de oferecer tudo que as pessoas com Alzheimer e outras demências possam precisar e, ainda, oferecer dignidade a elas.
ILPIs convencionais: Esse tipo de moradia é muito diverso. Eles atendem pessoas com níveis de dependência diferentes. Existem desde instituições nos moldes tradicionais de casas com espaços compartilhados, que normalmente abrigam idosos dependentes e independentes, até instituições no modelo verticalizado (estrutura de hotel) que oferecem moradia, assistência proporcional à necessidade de cada um e a possibilidade de convivência.
Como pudemos ver, as possibilidades de moradia para os mais velhos são várias e a
tendência é que surjam cada vez mais opções, mas o mais importante mesmo é sabermos o que importa para cada um de nós. Sabendo isso o próximo passo é nos planejarmos para nosso futuro que pode ser amanhã ou daqui a muitos anos.
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