Ingo Ostrovsky, 50emais
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Notícias da França: as famílias dos herdeiros de Antoine e Consuelo de Saint Exupéry estão perto de chegar a um acordo que vai encerrar uma enorme e milionária pendência, que colocou em lados opostos aqueles que seriam os responsáveis por um dos maiores sucessos literários de todos os tempos, as pouco mais de 90 páginas de O Pequeno Príncipe.
Antoine Marie Jean-Baptiste Roger, o conde de Saint Exupéry, foi um aristocrata francês, escritor e um dos pioneiros da aviação mundial. Desapareceu aos 44 anos com seu avião em 1944, segundo se acredita, abatido por fogo nazista. Nunca foi encontrado.
Em 1930, quando morava em Buenos Aires, de onde voava cobrindo as rotas sul-americanas da Aeropostale, conheceu a salvadorenha Consuelo Suncin. Paixão avassaladora. Casaram-se no ano seguinte. Não tiveram filhos e, segundo relatos de amigos, mantiveram um casamento bastante atormentado. A aristocracia francesa, aparentemente, rejeitou aquela talentosa imigrante latina, ela mesma escritora e amiga de tipos como Salvador Dali e Joan Miró.
Consuelo sobreviveu ao conde voador e viveu em Paris por mais 35 anos – faleceu em 1979 – e teve que brigar na justiça para pôr a mão em 25% dos direitos autorais do marido. Sua adversária – que também levou 25% – era uma sobrinha de Antoine. A Editora Gallimard ficou com os outros 50%. O livro, com aquarelas do autor, vendeu mais de 150 milhões de exemplares em todo o planeta e foi traduzido para mais de 200 idiomas e dialetos. Eu nem sabia que havia tantas línguas assim no mundo.
Quem entende do assunto diz que O Pequeno Príncipe só perde o título de livro mais vendido da História para a Bíblia.
O cachimbo da paz nessa turbulenta relação familiar poderá ser fumado no lançamento em breve de um livro com a correspondência extremamente amorosa entre Antoine e Consuelo. Ele se declara abertamente e credita a ela influências em várias de suas obras, inclusive e principalmente na história do principezinho que veio do asteroide B 612.
Neste surpreendente século 21, Saint Ex é acusado de machista e mulherengo. Seus detratores dizem que O Pequeno Príncipe tem apenas um personagem feminino: uma flor. Toda a história é construída obedecendo um raciocínio masculino, a começar pelo narrador, um piloto tentando consertar seu avião no deserto. E o próprio Príncipe.
Não ligo muito para isso. O que me chama a atenção no livro é o Príncipe nunca permitir que uma pergunta fique sem resposta. Saint Ex enfatiza essa característica – que eu apelidei de “qualidade” – várias vezes ao longo da fábula. Quem? O que? Como? Onde? Por Que? Essas cinco perguntinhas, as fundamentais do bom jornalismo, para o Pequeno Príncipe nunca poderiam ficar sem resposta.
Quem sempre tinha uma resposta na ponta da língua eram as Misses do mundo todo. Não sei como é hoje mas uns anos atrás 10 em cada 10 misses – verdadeiras princesinhas – declaravam que sua leitura de cabeceira era O Pequeno Príncipe. Isso fez do livro um queridinho dos frívolos, os que achavam que o bom da vida era ser inocente a ponto de ver um elefante escondido dentro de um chapéu. Os concursos de miss já não fazem tanto sucesso e as perguntas do mundo hoje são outras. Imagina quais eram as dúvidas do mundo em 1943, no meio da segunda guerra mundial, quando veio à luz a primeira edição do Little Prince nos Estados Unidos.
Hoje nossos exércitos não servem para derrotar nem os baobás, grande desafio na vida daquele principezinho que tinha apenas que mudar a cadeira de lugar para ver um novo por de sol, tão pequeno era seu planeta. No nosso planetinha aqui o pôr de sol acontece uma vez a cada 24 horas. Nossa ciência anda batalhando incansavelmente mas ainda não tem reposta a tantas de nossas dúvidas. Nossos políticos acham que verdade e mentira é tudo a mesma coisa, um amontoado de palavras.
O distinto público já não compra mais qualquer coisa, o dinheiro anda curto e a vida, muito perigosa. A inocência hoje é medida pela quantidade de lágrimas que derramamos
O Pequeno Príncipe não foi cancelado e continua vendendo bem!
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