Ingo ostrovsky, 50emais
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Tem hora que não dá para ignorar! A realidade anda tão arisca que fica impossível fugir, “ir para um lugar onde eu não conheça a lingua” como diz uma saborosa amiga.
Essa última semana, então, foi intensa. Logo no começo fez chorar muito brasileiro que foi bater palmas nas ruas para despedir um amado artista. Artista ganha aplauso quando é bom. Quando consegue desfilar talento. E talento, vocês sabem, é uma das grandes alegrias da vida. Paulo Gustavo era talentoso, amado, generoso, engraçado e parece que conhecia todos os brasileiros tamanho o número de homenagens que a gente viu/leu “em todas as telas”, como se diz atualmente em 50eMenos.
A morte de um artista tão popular levou muitos a acreditar que o banho de luto que estamos tomando pode provocar uma indignação publica até agora inédita. O silêncio das ruas poderia estar chegando ao fim? Faz um ano que perdemos Aldir Blanc, um dos muitos sambistas que o vírus levou. Os românticos ainda choram Agnaldo Timóteo. Os sertanejos perderam Mateus, que fazia dupla com Lucas. Dias atrás foi um velho parceiro de Tim Maia, Cassiano “o pai do soul brasileiro”. Teve ainda muito mais cultura perdida para a pandemia: escritores, advogados, filósofos, arteiros e outros artistas, médicos, enfermeiras… Sem falar nas milhares de enlutadas famílias. Com raras exceções, somos todos populares junto aos nossos, certo?
Os 29 mortos (até sábado) do Jacarezinho também estiveram “em todas as telas”. Eram “todos bandidos”, disse o vice-presidente. Ele deve saber, né mesmo? Vice-presidente sabe tudo, né mesmo? Ou não? Não deixa de ser irônico que quando todo mundo ria do “jacaré” invocado pelo presidente na sua campanha pessoal contra a vacina, a Polícia do Rio escolheu justo o Jacarezinho para mostrar que está imunizada e cheia de anti-corpos contra qualquer controle. Vai entender!
Os 400 mil+ da pandemia não estiveram apenas em todas as telas. Passaram também pelas páginas dos diários de muito país rico. Foram destaque no Parlamento Europeu, na Organização Mundial da Saúde e em outros lugares onde a velha chama ainda não se apagou. E no sábado li no jornal que só Brasil e Venezuela ainda receitam cloroquina. Como diz o ínclito Alfredo Ribeiro “ô raça!”
Percebeu que não escrevi uma linhazinha sequer sobre a CPI que rola no Senado?
Essa semana, o inesperado me fez uma surpresa, como cantava o inigualável Johnny Alf décadas atrás. Hoje em dia, quem sabe dizer o que é inesperado? E o que é surpresa?
O mundo inteiro fala sobre o “novo normal”. E para nós aqui, que vivemos de cabeça para baixo em relação ao mundo dos ricos (uma imagem deliciosa criada pela Mafalda) o que seria essa nova normalidade?
Livre pensar é só pensar. Esta frase de Millôr Fernandes resume o que temos para hoje.
Pense nisso!
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